terça-feira, 22 de julho de 2008

simplesmente sabe | 2

as atualizações estão prontas - eu me apronto também. meu melhor perfume para causar uma boa impressão. uma rosa vermelha: toda hora é hora de decisão. um cubo de chocolate também, um gole de rum. sinto receio, acho que me apresentarei em breve. não estou certa quanto a roupa que devo usar. às vezes não basta saber. de entendimentos breves e rasos já estou farta. note, contudo, que não estou a falar raso desta vez. eu me afirmo, me emponho com certeza - ou pelo menos como se ainda tivesse algo em que pudesse me firmar e me estabelecer. preciso existir sem insistência. estou ainda a tentar me livrar de certa dor de cabeça. é, ela vale a pena; mas eu estou a escrever as mesmas merdas. o mesmo rodeio de palavras pequenas e sem nexo - e não que seja ruim ser pequeno, é que eu, em particular, não sei ser. eu não aguento ser pequena: de restrito, já basta meu repertório.

este cesto de palavras sujas e esse balde de meias velhas a me incomodar.
eu sou uma camisa no varal: estou esticada esperando qualquer fantástica mudança climática.
é, tem mesmo muita coisa importante acontecendo.
e ela é linda. LINDA.

ela é um doce que produz vinhos de colheita tardia. acho que poderíamos mesmo morar em um apartamento pequeno, ou um tipo loft talvez. minha cozinheira combina perfeitamente comigo. assim, eu a imagino colocando nosso jantar no forno - não sei, algo com alecrim e alguns outros temperos - enquato eu pego um pano e o estico no sofá. não temos exatamente o costume de muitas formalidades. comemos com apenas um par de talheres. dividimos uma taça de vinho - a única taça de vinho que temos, os outros copos são copos que ganhamos em promoções de cremes ou de latas premiadas de refrigerantes. possuímos tudo o que temos. do sofá, eu consigo vê-la de costas. quando me viro, ela faz para mim um sinal de espera: nossa comida ficará pronta em breve. então ela fecha o forno, depois de checá-lo outra vez, e vem até minha direção. tomba minha cabeça para trás, nas costas do sofá, e me beija. seu beijo quase me mata a fome. seguido de um beijo na testa: já venho, meu anjo. eu chamo seu nome antes que ela se afaste, como se pudesse estancar o instante seguinte. ela dá a volta no sofá e me sugura pelos braços, me ergue pelos ombros. eu me levanto e então nos encontramos. eu não preciso sequer segurar seu corpo, ela já está segura por mim. seus olhos fundos são como palavras sortidas. ela me diz: você sabe, eu sou impulsiva. e eu digo: eu sei, essa é uma das coisas que eu mais gosto em você. seus dedos intercalam meu cabelo e ela suspira, falando com aquele humor amoroso no meu ouvido que já conhece meus pontos fracos. sorrimos. ouço o estalo do forno: nosso jantar está pronto. nosso futuro está posto à mesa com a gente. ela traz a travessa até o sofá e tira o pano pendurado no braço, esticando-o sobre a mesinha de centro. enquanto isso eu pego os pratos que compramos juntas a pouco tempo. pratos azuis. sem bordados ou flores. apenas azuis.

eu cobro de mim uma descrição decente. eu preciso escrever uma história a qual se possa atribuir certa credibilidade. mas sinto, contudo, que minha melhor história ainda não começou, por isso, justamente, temo começar a contá-la e acabar por distorcê-la. ou inventá-la demais e não ter tempo de vê-la passar. meu olhos são lentos e eu preciso sempre de tempo para ter certeza. eu não aguento mais gostar demais e, assim, não me ocorre condição pior do que a de ser poeta jovem. ou autora de romances juvenis. voltemos à mesa.

ela divide a porção da travessa em duas (fazemos sempre o suficiente para não sobrar) e se ajeita no sofá ao meu lado, depois de tirar o avental. passa as pernas por cima do meu colo e encosta, próximo a parede. seu corpo mantém uma ameaça - um sítio, como se pudesse me puxar para dentro dela a qualquer momento. ou então pudesse me tragar, me arrastar de forma a não me deixar partir jamais. sinto, nas refeições, que pertencemos uma à outra. não me ocorre, com isso, momento mais íntimo do que este.

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