quinta-feira, 31 de julho de 2008

explicação

e não que exigir demais seja ruim: a utopia nos faz caminhar.
onde será que eu arrumei essa sujeira?
estou a maquinar sobre erratas, e sobre errados.
não sobre situações que induzem, propriamente, ao erro.
mas, sobre o erro, em si.

comuniquemos.

agora fez-se problema

não, exigirei demais de você. nem mesmo qualquer coisa. você é pequena demais para que se possa pedir algo, agora eu sei. e eu apenas queria dizer a todo mundo que me gosta que hoje eu me gosto muito mais*. hoje todo o meu sacrifício de uma vida INTEIRA está sendo colocado a prova.


então saí de casa, a pretexto de não voltar mais: se ficar, eu enlouqueço. eu enloquecerei em mim, depois de você, INEVITAVELMENTE. eu repito as conversas que tivemos e não encontro sequer um momento específico que justifique essa ausência. romper com um comprometimento não é apenas romper, é tornar desinteressante. eu achei que minha vantagem era ter conseguido olhar para você sem que meus olhos se fixassem. mas não, eu estava enganada. você fez com que eu me apaixonasse por você, e agora, ah, agora você quer ir embora. e você vai de um extremo a outro, de um dia para o outro, me deixando no meio, me deixando ser puxada por você e para as direções contrárias para as quais você corre. acho que não obtive respostas, nem qualquer tipo de reação: eu temo acabar em pedaços pelo seu caminho. eu apenas me desloquei rapidamente, tentando acompanhar ser ritmo. eu disse que lhe gostava também. eu quase morri de preocupação naquela noite em que você me ligou e sua voz mal saía, eu mal conseguia ouvir você, porque seus bronquios não estavam suficientemente dilatados. eu não dormi, preocupada. e acordei no dia seguinte, com você dizendo que a minha voz lhe acalmava. mas que calma, que nada. essa mentira não vale a pena.

eu queria de volta os planos que fizemos.
os dias que passaram.
proximidade: AGORA FEZ-SE PROBLEMA.

doer depois

vomitei as vezes que disse que me gostava.
todas as vezes que INSISTIU que me gostava:
é, eu vomitei todas elas.

quarta-feira, 30 de julho de 2008

vinte anos velha

seria uma piada;
um motivo de chacota - chacota:
tal palavra lhe cheira naftalina.

e então, dentro dela, certa desobediência emocional.

a outra

então eu me contorci na cama por três horas que demoraram dois dias para passar. novamente, alguns momentos têm mesmo se arrastado. e eu me sinto sem saco para nada, nem paciência, nem qualquer urgência em relação a decisão prolongada dela. é, ela é mesmo indecisa demais. e não que o nosso segmento de afeto não tenha valido nada até aqui, porque de fato não creio nisso. apenas considero, no momento, que sua nobre confissão não tem qualquer valor. a sinceridade é uma merda: a ilusão protege dos riscos ácidos da paixão, assim, prefiro-a incondicionalmente. não tenho posição para deitar e dormir. não me ajeito. a outra parece pinicar meu corpo, cutucar meus ombros, puxar meus travesseiros durante um ato rápido e travesso. eu sinto meu avesso se sobrepor a mim. e não que seja incapaz de admitir ciúme, mas não colocá-lo de forma óbvia me resguarda. a unica forma de não ser louca é não admitindo, assim, a própria loucura a partir da qual me componho. e reponho. e sonho alto. ah, sonhos. eu sonhava, mas e daí? os sonhos não embelezam mesmo, não é?

passo uma das pernas por debaixo da outra. e repasso. e novamente o impasse de sempre, mas essa noite, em particular, seu corpo não me faz companhia. não sinto sua presença, nem sua respiração. nem mesmo o chão do quarto, antes com suas roupas e óculos jogados com confetes de carnaval. nem festa, nem nada. apenas o silêncio de uma noite que não passa. de uma noite que não tem por onde passar, uma vez que seus caminhos já estão de cheios do corpo da outra - não, isso não é um elogio. noutra posição, quem sabe, qualquer intenção de dormir. de pegar o sono e abraçá-lo forte, como ela costumava me abraçar, de forma a não de deixar sair jamais. teimo dizer-lhe: não diga que me ama - você nem sabe o que isso significa. o amor não é pendende, nem dubiativo. o amor é uma impertinência excessiva. não me ame caso pretenda deixar-me. amar não é saudavél.

já passava da meia noite quando me dei conta do ocorrido: hoje estamos a celebrar sete dias. uma semana: sete vezes seguidas de ligações e pendências. às vezes não preciso sequer propor brigas: o destino propoe brigas por nós. é, meu anjo, não tenho tempo para julgar seus extremos como gostaria. eu vivo a fazer emendas com os minutos que me sobram. dedicaria minha vida à você, caso dedicasse até suas dúvidas a mim também. outra vez, metade de você não me serve. e que merda, achei que não passaríamos de novo por isso. mesmo depois de sentar e lhe explicar os densos riscos da poesia, ainda insisto em tratá-la como uma de minhas personagens. digo-lhe frases poéticas em meio a nada ou a qualquer situação.

eu me confundo comigo.
não sei, não consigo.

ainda que tentasse me colocar plenamente sou pequena para essse espaço que me pede. então eu mesma penso em lhe conceder esse espaço, essa distância de pensamento entre nós. ainda que longe, ela parece estar a me rodear o tempo todo. sabe exatamente o que faço, adivinha minhas frases e a forma como mexo no café, enquanto concordo com suas dúvidas. ela sabe a hora que eu quero acordar, que saio para trabalhar. sabe a hora que não trabalho durante o expediente, ainda que sequer tenha pausa para almoço ou lanche. sinto que me conhece sem saber quem sou realmente. assim como em relação a ela, qualquer conceito sobre mim é precipitado. é extremo. é demais. é pesado demais. e tudo se torna, automaticamente, perseguição de instante seguinte. o que se efetiva em um momento, reparte-se no outro. assim, não me ocorre outro desfecho senão este: tempo, ocasião própria. passemos adiante tal cordialidade.

terça-feira, 29 de julho de 2008

freqüência nehuma impede

é, disse para que chegasse aqui por volta das nove, mas desde as seis já estou acordada. nem sei direito o que farei lá, apenas estou a repassar o recado. não, não quero nem perguntar. mistérios também fazem parte de mim, mesmo que ainda tenha medo de confessá-los em meio a meu reflexo de cara e coragem. minha identidade é nula. não sei nem soletrar: não deveria ir. minha saúde não corresponde a mim. não sou boa nisso, nem em nada. não ofereço padrões, tampouco imponho minha pessoa a alguém. não me considero assim tão cheia de histórias ou de dicas sobre segurança no trabalho. isso é apenas uma forma básica de arrecadar dinheiro: que seja, não acho justo mesmo assim. o fato de acontecer o tempo todo não torna aceitável.

segunda-feira, 28 de julho de 2008

simplesmente sabe | 3

pensei que talvez pudesse apenas continuar a fazer suposições sobre nosso futuro, agendando compromissos e festas em casa com jantares para amigos, mas não. achei que tudo era mesmo uma fantasia, um momento breve de êxtase. então eu me sentei na cama, e conversamos por horas, assim, os mesmos planejamentos, seguidos de alguns novos planos para uma vida que não exigirá demais. ela disse que eu era exigente: pois que sou mesmo. teremos um cachorro pequeno, daqueles que parecem ser filhotes para sempre - algumas coisas que se conservam intactas podem se tornar boas com o tempo. e teremos um apartamento grande, mas não enorme: ainda estamos em dúvida quanto ao número exato de quartos. faremos economias, desligando a luz sempre que trocarmos de cômodo. eu lhe disse que poderíamos também começar em um lugar menor, e decorá-lo com o tempo. ela gosta de revistas de arquitetura e decoração de interiores, disse que trataria isso como hobby. eu disse que eu poderia ficar com a casa, ou fazendo compras - mas não sei quanto a isso. não consigo ficar quieta muito tempo, tampouco me dedicar exclusivamente a uma atividade. vou precisar trabalhar também: tudo bem, trabalharemos nisso com o tempo. ainda temos que considerar o resto das contas. água, luz, energia. o gás é por conta do prédio e, quanto a TV a cabo, puxaremos um gato do vizinho, bem como a internet.

outra vez, eu a imagino. vejo seu corpo chegando cansado depois de uma dia comprido de trabalho. escuto o barulho das chaves do carro a trepidar na mesinha: ela finalmente está em casa. ela ascende o abajur ali perto, e coloca a bolsa na cadeira, próximo ainda a entrada da sala. ela sempre repete passos. do quarto, escuto com clareza seu movimento. eu não preciso sequer vê-la: eu já sei exatamente onde ela está. enquanto ela passa pelo corredor, o filhote faz festa para ela. os latidos finos e amorosos se aproximam conforme ela se aproxima da porta também. então, já próximo a entrada, ela o pega no colo com uma mão apenas e faz um carinho em sua cabeça. diz que há horas não via a hora de voltar para casa. eu, sentada na cama, de pijama e óculos, separo as faturas do nosso cartão - gastamos, mas não gastamos demais. ela me olha, agora já dentro do quarto, e afasta os papéis da minha frente. coloca o filhote no chão: minha vez de ficar com ela, e sorri para mim. sei que ela chega normalmente às nove, então já estou contente desde às oito. ela tira o terninho preto - suponho que teve alguma reunião importante, pois ela sempre o usa em dia de fechamento de contratos ou de grandes oportunidades - e se senta ao meu lado, de modo a deformar um pouco a beirada da cama. pergunta como estou, já segurando meu rosto, como se desaparecesse tudo. ela me beija e então me deixa solta. abraça meu corpo forte contra o dela logo em seguida, como se pudesse me deixar partir em um instante e, no outro, não me soltar jamais. ficamos assim por meia dúzia de segundos, até que ela me afasta um pouco de seu rosto e diz que me ama muito. fazemos aquele momento de silêncio convencional que acontece sempre depois das declarações de afeto, e então eu digo que a amo também. o filhote faz festa e solta um grito agudo, como se pedisse atenção também. ela sorri para mim outra vez, abaixa para pegá-lo e o coloca na cama, ao meu lado. aconselha que ele se comporte: vou tomar banho, e já volto. eu balanço a cabeça, de forma a concordar. ela me beija outra vez, e vai até o pequeno closet que temos, pegar a calça velha com a qual dorme sempre. eu a espero voltar para dormimos, e ela sabe disso.

quarta-feira, 23 de julho de 2008

coisa de doido

tenho estado de festa sem casa. festa a céu aberto, coisa de doido e de maluco sem perna. às vezes penso em voltar atrás, e reconsiderar minhas prévias decisões; todavia, não. não posso me virar porque apenas me encontro em ruas de meio porte, ou de violência irrustida - é, coisa de gente metida mesmo, que não consegue me ver conversando e tomando cuba libre com toda aquela gente da alta. talvez devesse parar a marcar outra reunião para essa semana ainda, na terça talvez. e quanto mais gente, mais demorado acaba sendo. chamarei todo esse pessoal de montagem.

tenho estado de festa sem casa. festa a céu aberto, coisa de doido e de maluco sem perna. às vezes penso em voltar atrás, e reconsiderar minhas prévias decisões; todavia, não. não posso me virar porque apenas me encontro em ruas de meio porte, ou de violência irrustida - é, coisa de gente metida mesmo, que não consegue me ver conversando e tomando cuba libre com toda aquela gente da alta. talvez devesse parar a marcar outra reunião para essa semana ainda, na terça talvez. e quanto mais gente, mais demorado acaba sendo. chamarei todo esse pessoal de montagem.

tenho estado de festa sem casa. festa a céu aberto, coisa de doido e de maluco sem perna. às vezes penso em voltar atrás, e reconsiderar minhas prévias decisões; todavia, não. não posso me virar porque apenas me encontro em ruas de meio porte, ou de violência irrustida - é, coisa de gente metida mesmo, que não consegue me ver conversando e tomando cuba libre com toda aquela gente da alta. talvez devesse parar a marcar outra reunião para essa semana ainda, na terça talvez. e quanto mais gente, mais demorado acaba sendo. chamarei todo esse pessoal de montagem.

notas | 2

a referência que eu tinha distorceu-se.

terça-feira, 22 de julho de 2008

simplesmente sabe | 2

as atualizações estão prontas - eu me apronto também. meu melhor perfume para causar uma boa impressão. uma rosa vermelha: toda hora é hora de decisão. um cubo de chocolate também, um gole de rum. sinto receio, acho que me apresentarei em breve. não estou certa quanto a roupa que devo usar. às vezes não basta saber. de entendimentos breves e rasos já estou farta. note, contudo, que não estou a falar raso desta vez. eu me afirmo, me emponho com certeza - ou pelo menos como se ainda tivesse algo em que pudesse me firmar e me estabelecer. preciso existir sem insistência. estou ainda a tentar me livrar de certa dor de cabeça. é, ela vale a pena; mas eu estou a escrever as mesmas merdas. o mesmo rodeio de palavras pequenas e sem nexo - e não que seja ruim ser pequeno, é que eu, em particular, não sei ser. eu não aguento ser pequena: de restrito, já basta meu repertório.

este cesto de palavras sujas e esse balde de meias velhas a me incomodar.
eu sou uma camisa no varal: estou esticada esperando qualquer fantástica mudança climática.
é, tem mesmo muita coisa importante acontecendo.
e ela é linda. LINDA.

ela é um doce que produz vinhos de colheita tardia. acho que poderíamos mesmo morar em um apartamento pequeno, ou um tipo loft talvez. minha cozinheira combina perfeitamente comigo. assim, eu a imagino colocando nosso jantar no forno - não sei, algo com alecrim e alguns outros temperos - enquato eu pego um pano e o estico no sofá. não temos exatamente o costume de muitas formalidades. comemos com apenas um par de talheres. dividimos uma taça de vinho - a única taça de vinho que temos, os outros copos são copos que ganhamos em promoções de cremes ou de latas premiadas de refrigerantes. possuímos tudo o que temos. do sofá, eu consigo vê-la de costas. quando me viro, ela faz para mim um sinal de espera: nossa comida ficará pronta em breve. então ela fecha o forno, depois de checá-lo outra vez, e vem até minha direção. tomba minha cabeça para trás, nas costas do sofá, e me beija. seu beijo quase me mata a fome. seguido de um beijo na testa: já venho, meu anjo. eu chamo seu nome antes que ela se afaste, como se pudesse estancar o instante seguinte. ela dá a volta no sofá e me sugura pelos braços, me ergue pelos ombros. eu me levanto e então nos encontramos. eu não preciso sequer segurar seu corpo, ela já está segura por mim. seus olhos fundos são como palavras sortidas. ela me diz: você sabe, eu sou impulsiva. e eu digo: eu sei, essa é uma das coisas que eu mais gosto em você. seus dedos intercalam meu cabelo e ela suspira, falando com aquele humor amoroso no meu ouvido que já conhece meus pontos fracos. sorrimos. ouço o estalo do forno: nosso jantar está pronto. nosso futuro está posto à mesa com a gente. ela traz a travessa até o sofá e tira o pano pendurado no braço, esticando-o sobre a mesinha de centro. enquanto isso eu pego os pratos que compramos juntas a pouco tempo. pratos azuis. sem bordados ou flores. apenas azuis.

eu cobro de mim uma descrição decente. eu preciso escrever uma história a qual se possa atribuir certa credibilidade. mas sinto, contudo, que minha melhor história ainda não começou, por isso, justamente, temo começar a contá-la e acabar por distorcê-la. ou inventá-la demais e não ter tempo de vê-la passar. meu olhos são lentos e eu preciso sempre de tempo para ter certeza. eu não aguento mais gostar demais e, assim, não me ocorre condição pior do que a de ser poeta jovem. ou autora de romances juvenis. voltemos à mesa.

ela divide a porção da travessa em duas (fazemos sempre o suficiente para não sobrar) e se ajeita no sofá ao meu lado, depois de tirar o avental. passa as pernas por cima do meu colo e encosta, próximo a parede. seu corpo mantém uma ameaça - um sítio, como se pudesse me puxar para dentro dela a qualquer momento. ou então pudesse me tragar, me arrastar de forma a não me deixar partir jamais. sinto, nas refeições, que pertencemos uma à outra. não me ocorre, com isso, momento mais íntimo do que este.

segunda-feira, 21 de julho de 2008

simplesmente sabe

eu queria tirar a minha cabeça e minhas costas. é, você cria uma imagem com o passar do tempo - alguns dias têm mesmo se arrastado. então eu a imagino, e ela vestia um terninho azul marinho e carregava um jornal no bolso de trás da calça. cabelo preso, óculos. uma penumbra de mistério. ela chega sempre por volta das nove, mas continua a trabalhar até as dez. suponho que ela tenha sempre muito trabalho a fazer e sua profissão esteja a lhe entortar os horários. assim, um tipo de executiva. ela disse que se imagina chegando em casa, e a mulher de sua vida a lhe esperar, de vermelho. ou então algo totalmente contrário. uma mulher que trabalhe, e que construa um lar com ela - disse que não vale a pena bater de frente para depois apanhar. tem que ser alguém que valha a pena para que a surra possa valer também. sinto certa aventura em suas palavras. disse que teríamos um apartamento pequeno, só para dormir - ou não dormir, ainda brinquei. ou então um apartamento enorme e, como ganharíamos muito dinheiro, pagaríamos alguém para limpar. ela solta um suspiro breve, como um espasmo, e diz meu nome duas ou três vezes, como se o espaço entre nós pudesse ser consolado por um instante. às vezes alguma coisa deve acontecer para que se possa colocar fé. ela me perguntou se isso tinha sido uma indireta, respondi que sim. o fato de não poder vê-la com freqüência acabou permitindo que a gente se conhecesse ainda mais - não sei, mas achei válido. a gente só precisa de tempo agora.

- eu trabalhando e você na praia?

do outro lado, ela ri.
perguntei-lhe:

- você não quer mais nada, não é?
- quero.

- quer?
- quero você.

desligamos o celular

pois que se deitou e, logo em seguida, ajeitou o travesseiro perfeitamente por debaixo da cabeça. ela não dorme de cabelos molhados, tampouco sai com eles ainda úmidos na rua - isso lhe dá a impressão de desleixo, como se dissesse: saí do banho, e vim direto!, dá-lhe a impressão de estar sempre atrasada, faltante. ela disse também que estava com sede, mas que tinha preguiça de levantar e ir buscar água. teria que descer até o andar térreo: não valeria a pena o esforço, acrescentou. eu me propus a ir pegar, e, ainda esclarecendo, perguntei se ela preferia gelada ou sem gelo. ela disse que gelada - sem gelo não mata a sede. concordei. então eu disse que ainda escovaria os dentes e desligaria a luz do corredor e, depois, voltaria para a cama. ela disse para que eu não demorasse, e eu disse que não aguentava mais ficar longe dela mesmo. novamente o que tinhamos não era suficiente. eu precisava sentir seu corpo o tempo todo: ela tinha que ser inteira, eu lhe disse isso também, e então expliquei: inteira, sabe? corpo e cabeça. ela disse que me adorava, e eu disse a mesma coisa - talvez já tivessemos superado toda sua espontaneidade anterior - tudo bem. passamos por um silêncio breve, o tempo de um suspiro mais longo, talvez. disse que já levaria seu copo de água.

- dorme bem, meu anjo.
- você também.

(desligamos o celular)

domingo, 20 de julho de 2008

tempo, desconfio

o tempo não passa.
essa semana mesmo demorou três meses para passar.
eu sei, eu mesma contei.
e agora esse domingo.
ah, esse maldito domingo é interminável.
esse domingo está a demorar o final de semana inteiro.
um minuto demora três. e três, mais quatro.
é estranho passar a pé pelas ruas que sempre passo de carro.
o sinal parece maior que o comum.
ou eu, menor.
mas ele já tem esse tamanho mesmo,
e eu, ah, eu sou só uma projeção de mim.
eu tenho o tamanho do que penso.
eu sei, eu me recuso a contar outra vez.
noutra vez, quem sabe, o fim.

eu aguardo.

notas

você é algo pesado, de tanta maldade.
isso faz você perder o equilibrio.

os óculos

os óculos davam a impressão de ver demais.
ela achava que eu era um fracasso: seus olhos me diziam isso.
eu olhava para ela, mas meus olhos nunca haviam se fixado nela.
(talvez essa fosse a minha vantagem)
ela fazia questão que eu ficasse de óculos,
e eu a achava meio degenerada.
a vergonha é uma forma do medo também:
sim, meus sonhos ainda são imagens.
mas agora, agora que estamos a sós, vou deixá-la sozinha.
sem pretenção de culpa ou peso na consciência:
tudo aqui ainda a lembra.
e não que o simples seja desleixado.
NÃO.
o simples apenas é irredutivél.
é aquilo que deve ser e mais nada.
um conhecimento nasce de um incômodo.

sábado, 19 de julho de 2008

é

eu mal tenho histórias para contar.
eu
sequer
vivo.
minto, eu apenas minto.
mente, ela apenas mente.
ela inventa histórias que eu não tenho.
eu
sequer
tento.
eu sinto muito.
eu não sinto nada.
eu não posso sentir.
eu não me permito.
não me abro.
não vazo, eu já vazei litros há horas atrás.
eu
sequer
ganho.
mas também não perco.
eu não tenho o que perder.
eu vou por mim.
por mim, eu vou.
eu
sequer
vôo.
eu apenas plano.
planos. ah, planos.
panos.
pandas.
pratos e prostitutas.
filha da puta.
você não passa de uma miséria.
ou de uma mera coincidência.
você é minha história.
a unica história que tenho.
é, a única.

ainda tem um erro aqui

- tem um erro aqui.
- como você sabe?
- cometi-o.

- ainda tem um erro aqui.
- e, agora, como você sabe?
- eu não sei, justamente.

sexta-feira, 18 de julho de 2008

more than words | 2

disseram que eu não deveria me apegar. mas quer saber? eu não consigo. eu só consigo viver uma vez por vez. não dá para eu ser e não ser. só dá para ser completo, ou então não ser coisa nenhuma. eu sou inteira, e você precisa ser inteira também. ou pelo menos extrema. eu odeio qualquer meio-termo. adoro impasses, mas odeio meios-termos. não é justo se doar inteiro, e só ter metade. sofrer inteiro, e só ter metade. ou ter um quarto, menos que isso. um carro, ou quem sabe só o banco de trás de um carro. eu não sei ser pequena. meu tamanho vive a me extrapolar e a exigir demais de mim. é assim que eu cresço. eu quero ser gigante dentro desde cubículo. e eu a quero toda, eu já sou louca por você. sou doida de pedra, nem sabe. eu estou cansada de estar sempre totalmente errada. eu estou cansada de tomar na cara por qualquer metade. ainda que eu me coloque toda, eu continuo a levar surras. eu morro de medo de não conseguir ser quem eu sou. eu tenho medo de falhar comigo: eu já não aguento mais me decepcionar. eu estou farta de abarçar, eu preciso de abraços também. meus extremos são, por demais, desengonsados; e eu acho também que não ficar para a festa seria ainda pior do que nem trazer presentes. eu estou cansada de sempre renunciar, de novo.

será que ainda tem gente que se gosta, mas não consegue ficar junto? eu queria ter notícias maravilhosas para lhe dar, mas não. eu não tenho nada. eu só tenho eu para oferecer. eu queria ser justa e perdoável. mas ninguém perdoa os delírios de um grande amor - ou de uma paixão desvairada. e em quanto tempo será que a gente termina? eu ainda acho que nosso tempo aqui é tão curto. a gente vive cem anos, É RIDÍCULO.

(eu queria um beijo, entre tragadas e goles)
(eu queria seu beijo para tirar esse cigarro e copo)

eu sou invisível?
não. é muito triste isso.
não quero pensar assim.
sou tão enorme que passam despercebidos por mim.
é.

eu queria lembrar do seu rosto, mas apenas seu gosto me ocorre. eu queria saber seu corpo, mas eu só me lembro do seu cheiro. será que eu estou perdendo você dentro de mim?
eu enlouqueci em você.

e isso, é profissão?

- o que você faz?
- sou escritora.
- e isso é profissão?
- não. é passatempo. e você, o que faz?
- sou engenheiro.
- e isso, é profissão?
- é.
(silêncio)

quinta-feira, 17 de julho de 2008

more than words

talvez não importe o quanto você se importa, mas eu, realmente, me importo demais. eu dou importância ao que temos. e por que chorar? não chore. ou chore. não julgo chorar sinônimo de fraqueza - então não tenha medo de parecer fraca, pois. eu me acho tão mole para tanta coisa também. primeiro ela dá tapa depois quer dar colo? É, NÃO ENTENDO. entenda, contudo, que chorar me ocorre certo sentimento de invasão. quando não caibo dentro de mim, quando não me comporto, quando não tenho o que dizer mais, quando não me defino ou me estabeleço, quando não cresco certo, eu choro. e então quando paro, me sinto estúpida: chorar implica indignação também. se é tão simples, por que diabos haveria de perder tempo chorando? suponho que chorar não seja assim tão nobre ou poético, mas sim térpido. tosco mesmo. coisa de gente retardada. eu não irei embora se você me disser que também não irá. sabe, às vezes acho que não posso mais. sinto não conseguir continuar mais em algum momento breve, apesar de relutar contra a parada. eu entendo, também; e de fato acredito que se deve estar com alguém que lhe faça perder os cabelos. daí o ditado: tem que ser quente ou frio, de for morno eu te vomito. exato. eu quero ver você louca, sem juízo. faminta. intensa, inquieta, agitada. medrosa. suada, molhada, encharcada. grudada em mim. feliz. é, eu quero você feliz.

eu quero conhecer você para que o tempo permita que me conheça também. eu tenho saudades do seu beijo, do seu cheiro; e tenho tanto que seu perfume ainda está na minha blusa, no meu cabelo. seu gosto ainda está na minha boca e seu rosto, na minha imaginação. tenho saudades do seu sorriso sério. do seu jeito de brava. do seu olhar de calma: parece que foi agora mesmo a última vez que eu olhei para você. definitivamente não sei explicar, alguma coisa me deixa presa a você. alguma coisa me puxa para perto de você, me arrasta, me gosta com você.


eu não sei dar metade de mim também.

quarta-feira, 16 de julho de 2008

ela praticamente engolia meus brincos

suponho que continuar a descrevê-la não me proporcionará qualquer triunfo, então eu me contenho: eu sou meu copo vazio de água sobre a mesa. pois que iniciarei uma conversa longa e interminavel entre nós: temos mesmo muitos assuntos para tratar ainda. ela praticamente engolia meus brincos. devorava meus olhos e cabelos. nunca cheguei a experimentar uma paixão tão feroz como essa, ou tão ardida. antes aquela mesmice de cartas com versos de terceiros. aquela paixão melada, de trovadores jovens e aflitos. eu me encarrego de morrer depois. ela praticamente engolia meus brincos. devorava meus olhos e cabelos. então eu fico com aquela desgraça: e se eu chegar no carro, e não estiver no carro? preciso parar com essa mania de pensar demais. eu costumava deixar bilhetes no canto da porta, proximo aos cds, imaginando não esquecê-los jamais. mas eu os deixava sempre aos prantos, sozinhos e esquecidos, como meias de seda, depois do ato de amor. ela praticamente engolia meus brincos. devorava meus olhos e cabelos. ou então potes de mel, intimidados por abelhas que acreditam que a produção dócil ainda as pertence. não me admito, tampouco me recordo da úlima vez que me proporcionei tal atitude tão altruísta. eu me deixo, me abandono, me largo para sempre. e ela? ah, ela praticamente engolia meus brincos. devorava meus olhos e cabelos.

velhos hábitos

e não que entendê-la seja de fato uma questão relevante ou de extrema necessidade. apenas constato que nenhum imediatismo me atrai, e contraio doenças breves aqui e ali - melhor assim, penso, antes doente do que impossiblitada de escrever. não existe prazer maior do que escrever. não existe. posso passar horas sentada, não preciso comer ou beber. estou posta como mesa de jantar, que oferece tudo o que tem sem esperar nada de volta. estou a salvo, automaticamente.

terça-feira, 15 de julho de 2008

a cabine

é, achava mesmo que a janela de sabrina era poética demais. mas faria o quê? suas tintas ainda secavam no parapeito, breves e calmas. acalmava-se também. assim, uma calma por tabela: haveria de tentar se enquadrar de alguma forma. sua excitação havia passado e agora sim poderia se dedicar a outros pensamentos. tinha crescido naquele bairro, naquele beco e ainda não sabia nada sobre ele. nenhuma história ou aspiração. o mesmo bar de velhos - agora mais velhos. passara a maior parte do tempo dentro de casa, a escrever: mal teve esperiências. apenas algumas lendas desvendadas com a imaginação. crianças tendem a se cercarem por mistérios mesmo. não foi diferente com ela. sequer os jogos da liga de beisebol eram suficientes para que as lembranças se sustentassem: havia destruído todas. e que merda, não? a mesma infância tosca de antes. nem mesmo sofrida, tosca mesmo. infância com bonecas de pano entre os lençóis de flores e galhos finos. em meio ao quarto de nenhum outro irmão ou gato. nunca tiveram cachorro ou qualquer outro animal. haviam lhe convencido de que os animais deveriam ficar no zoológico. logico, pensava. animais presos são mesmo uma solução exelente. sabrina sempre quis ter um casal de passarinhos. aqueles canarinhos amarelos, que cantam fino e contínuo o dia todo. ela tem pensado sempre no nome que daria a eles, e pede sua opinião também. concorda, apesar de achar que chico e lola não são exatamente nomes para aves. acha engraçado. sabrina lhe olha uma vez e outra no intervalo das tragadas, conferindo seu corpo na cama, de forma a vê-lo ainda pousado da mesma maneira como havia sido deixado, minutos atrás. ana laura tem o corpo de um caçador exausto, contrariado por sua presa. contraído. arrastado por sua presa durante horas e por vários quilometros seguidos. olha de volta para ela. outra vez o momento da troca de sorrisos discretos: às vezes não se tem muito o que fazer - já haviam feito tudo. sabrina ajeitou a cortina, de modo a conter um pouco a luz que entrava. seu apartamento, a cabine, o albergue europeu, escureceu um pouco. seu toque de mistério estava em toda a parte agora. estava pronta. estava perfeita para ela outra vez.

uma praia aqui no quintal

olhei pela janela do quarto e a vi abaixada lá fora, perto do vaso de cerâmica que terminara ainda a pouco - seu trabalho estava resumido quase a uma peça de roupa no varal. ela repuxou as mangas da camiseta até o cotovelo, e tirou o cabelo liso do rosto. suas mãos estavam cobertas com aquele monte de barro endurecido. ela me remeteu um aspecto velho. notei que ela usava um avental listrado também - ela colecionava aventais durante o verão, e conchas nos períodos mais frios. nunca entendo seus vicios, tampouco ela entende os meus: temos o costume de conviver com estes segredos invioláveis de cada um de nós. perguntei-lhe:

- o que você está fazendo?
- estou fazendo uma praia aqui no quintal.

segunda-feira, 14 de julho de 2008

quinze para as quatro do sábado

ambienta-se. um fio de cabelo rebelde: tentou esticar o cabelo, mas não teve sucesso. o lápis de olho pequeno e já sem ponta. uma blusa preta e justa, que não lhe cabe propriamente: tentou ajeitar o pequeno decote, mas sentiu não ter muito o que mostrar - nem a quem mostrar. calcinhas no chão. meias no lustre. nenhum luxo. tem certo ar cansado, mas também de raiva. um jeito de quem olha, mas não consegue se ver, nem se distinguir em meio a outros. está sozinha no quarto. no banheiro. no box. não tem mais sua lua. tem certo ar de espera também. achava que ela deveria ter ligado ainda ontem. não ligou, contudo. apenas limitou-se a simplificar a situação: foda-se. então, foda-se também. está a arrumar-se pra niguém em especial. está na expectativa. não vai ligar, mas espera, profundamente, que ela ligue. ela sempre ligava mesmo. então aguarda. talvez não devesse esperar tanto de alguém que pensa conhecer tão pouco. e não devesse considerá-la assim tão previsivel. rotinas sempre devem manter mistério, apesar do esforço contrário as quais se propõem. às vezes se bate mais que o necessário. então um toque repentino. esperado, porém ainda surpreso. um toque de quebra de silêncio, atrevido. o nome dela pisca na dela já cheia de dedos do celular, como se chamasse a atenção. pedisse atenção. resguarda-se, como sempre. tremedeira. frio. faz mesmo drama para tudo. inverno de palavras que não foram ditas. ou que foram ditas demais. perda de tempo lhe ocorre. tem medo de voltar a correr em circulos. desde ontem está a esperar por ela e pelos beijos que estão combinados, há semanas. hesita em atender por um instante, todavia, reconsidera. desiste da aversão, do apetite irresistivel que sente por um instante. senta-se na cama, fingindo conforto e confiança. atende com um cumprimento seco. ambas com a mesma voz de merda e de desculpa não pedida. acha que ela não vai admitir o erro, mas não. então pede desculpas também. tudo bem, assume não deveria ter dito o que disse. ainda acha a comunicação um pouco vazia. reconsideraram. eram quinze para as quatro. pergunta-lhe:

- que horas você vai sair?
- quatro e quinze.

silencio, claro.
tinha muito para lhe dizer, mas não conseguia expressar-se como queria. não teria tempo suficiente. assim como o dinheiro, o tempo é uma merda (principalmente quando não se tem nenhum). o telefone era pouco para o que precisavam. precisava ver os olhos dela, caso contrário qualquer argumento seria em vão. nada que lhe dissesse mudaria o momento. toda sua informação está perante ela, como se aguardasse um decisão. então apenas limitou-se novamente. despediu-se e, assim, comentou, dizendo que esperava que ela fizesse uma boa viagem de volta. voltariam a se falar quando ela chegasse. se chegasse - ou se voltassem. ainda que continuasse a sentir a outra dizendo suas palavras, agora ela piscava fraca e longe. cambaleava bêbada para outro lugar. não esqueceu, mas também não havia trazido nada que comprovasse a validade da espera. não disseram que sentiam saudades ou que se adoravam. aquela conversa tinha um ar particular de fim. desligaram. apenas desligaram.

sexta-feira, 11 de julho de 2008

cinco para as cinco da sexta

pegou um folha em branco em meio os rabiscos que havia começado naquela tarde. não sabe, mas sente falta de idéias novas. ou ao menos revolucionárias. esticou-a sobre a mesa de madeira maciça, já com algumas rachaduras e manchas das gerações passadas, e fez o desenho de um rosto. o rosto de uma mulher. postou-se diante dela, da forma mais elegante que poderia ter perante um amontoado de grafiete. olhou ao redor. talvez ainda fosse cedo, apesar do sol baixo que invadia pelo janelão à sua esqueda. uma claridade de por-do-sol já, como que cansado e feliz. lembrou-se de que ela havia lhe dito que pegaria o onibus às cinco e quinze, cinco e vinte no máximo. quer falar ao ouvido, mas não consegue. por que diabos haveria de ter feito piadas em momentos inoportunos? chateou-se, será? não sabe. assume não ter sido facil, uma vez que não pode cuidar de algo que não lhe pertence propriamente. não pode doar-se, sem doações imediatas. não pode dar a cara a tapa: está esgotada de levar esporros. outra vez, não vai se disponibilizar por completo. ainda tem medo de não conseguir conter-se, e acabar por aí, em partes. olhou novamente para a moça estampada no papel: ela lhe parecia ter um ar sereno e também vadio. merda, mais uma vagabunda? não vai aguentar. e nada de superlativos: odeia os superlativos. apenas adjetivos pobres de meia categoria. ela era mesmo linda. linda. LINDA. rabiscou cabelos e brincos. sobrancelhas, e então uma boca enorme, cheia de batom e sombreado. uma boca de mulher rica, que não tem tempo para nada. desenhou-lhe um rosto sem nexo. um nariz de parafuso. um nariz de nabo velho e amargo: um nojo. precisa falar-lhe. ligar-lhe. mas não, é estúpida demais. apenas faz piadas que a afastam. vai jogá-la nos braços da outra. nas pernas da outra. nas costas da outra. e que arrepios, que nada. não lhe toca as costas há semanas, está entre saudades e adoração, todavia, sua paciência pequena há de lhe gerar empecílilhos. e não que não tenha confiança nas palavras de boa noite, mas não consegue entregar-se completamente. limita-se por opção. a desconfiança leva ao delírio.

quinta-feira, 10 de julho de 2008

ambulante | 5

não posso. não vou mais me comportar: transbordarei de mim. seu perfume na escada, no piso, na sujeira dos cantos que não se limpa há meses. seu beijo ainda no meu corpo de rosto magro e com bochechas rosadas. sinto certo cansaço de nada. não aquele esgotamentos proviniente de atividades intensas, mas de pequenas atitudes desgastantes. não aguento mais mostrar-lhe o lugar dos panos de prato ou das xicaras. não aguento mais contar-lhe a mesma história curta de vida que tinha, a única merda de história que tinha, de uma menina de dezenove anos que perdeu os pais na saída de um jogo de futebol. e não aguento sua mania de deixar a toalha em cima da pia, como se fosse um difunto a apodrecer. eu me canso dessas coisas pequenas e sutis. definitivamente não quero o pouco que tem a me oferecer. eu estou a me encerrar.

você me cansa, paixão

um chute no ar, uma revolta qualquer. sou mimada mesmo, não aguento coisas serem tiradas de mim. ou tomadas de mim. sequer dou uma mordida do meu chocolate. eu o descasco no canto, só para não ter que o dividir com niguém. sou gulosa. louca de pedra. morro de velho, e olha que nem tenho assim tantas experiências. foda-se. quer ir embora? então que vá. vou jogar o número do telefone dela na privada, pisotear no tapete, fazer uma macumba. uma reza brava. ou braba. comprei-lhe um vaso de flores, de lirios - seus favoritos - e os coloquei em um recipiente de barro com terra fofa e minhocas, as quais eu mesmo nomeei, uma a uma. tenho mesmo essa mania dos detalhes. eu me importo com tudo. mas agora, seu cheiro está no congelador, junto com os brigadeiros que fiz com o maior carinho que tinha - aliás, ainda tenho granulado nas mãos e os dedos melados. ela me disse mesmo que era grudada demais, que se apegava facíl. mentira, correto? apenas mais uma promessa entre outra meia dúzia de breves pretenções. mas o que posso fazer a respeito? se não viver de promessas, vou viver de quê? tudo que tenho são promessas. promessas são as coisas mais concretas que tenho. lancei o vaso torto contra a janela. irrite-me, acho que estou próximo ao limite da minha paciência. não suporto seu rosto. seu corpo no meu. seu gosto no meu. sua boca vermelha e com gosto de doce de padaria. gosto de sonho velho, que fica embrulhado no canto da pia, esperando ser devorado de madrugada. não aguento.


a paixão faz a gente cometer atos estúpidos.

saí, sumi de mim

estiquei o braço para fora da janela de modo a testar a temperatura. o sol não mais me engana, desconfio. mesmo essa blusa grossa de linha está a me deixar desfonforto. arregacei as mangas: alguns pingos leves de chuva ou de choro. a menina do andar de cima está em pratos há dias. sua familia inteira foi embora: é, eles eram um bando de merdas mesmo. uns covardes, uns filhos da puta. eles sairam no meio da noite, levando correspondencias e dinheiro debaixo de seus braços enormes. o pai, em particular, tem aquele ar de cafetão gordo e sujo. um monte de inundos. arrastaram a irmã mais velha, ainda grávida, pelo corredor social. seu vestido de flores secas desinfetou o chão, o tapete, o resto de decência que ainda poderiam ter. levaram aquelas malas melecadas de molho vermelho e arroz, um nojo. a mãe não disse nada, apenas insistiu para os outros que se apressassem, pois não queriam ser vistos. ela está trancafiada no apartamento, esperando a volta de alguém. ela não usa mais roupas. ontem mesmo a vi arremessar várias peças pela janela, que planaram por cima de minha cabeça oca. não posso ir até lá agora, estou atrasada. não sei qual roupa vestir. qual sapato colocar. nao tenho tempo para conversas com desaparecidos. eu sumo da minha própria vida, e niguém, sequer, nota. saí. sumi de mim.

segunda-feira, 7 de julho de 2008

idéias com um vagabundo

- você comete sempre os mesmo erros.
não cansa?
- canso.
- e por que volta a cometê-los?
- estou esgotado.
- de cometer erros?
- não, de nunca corrigi-los. sabe, não tenho tempo para mudar de vida.
- com o que você trabalha?
- não trabalho.
- não?
- não.
- como não?
- não. eu apenas erro.
- e não cansa?
- canso.
- e por que continua a agir assim?
- estou esgotado.

após o sinal, diga seu nome

tanto espaço em um dia nublado. é, eu penso mesmo em deixar tudo que tenho aqui para trás, em troca de incertezas; esse prédio é alto demais. sinto certa vertigem daqui. olho para baixo e os carros se perdem. as pessoas se perdem. os cachorros de rua não sabem as ruas mais perto, nem os postes. as pessoas dos prédios ao lado me olham como se mirassem em mim. riem de mim e do que me tornei. sou um brinquedo vendido em vezes. à prazo, em parcelas minúsculas e inacabáveis. aqui meu celular não funciona. aqui, nessa mesa de escritório, minha produção é restrita, bem como meu repertório. ah, eu queria um copo de leite, saí de casa sem comer nada. qualquer comida estava a me revirar o estômago. trouxe um livro na mochila, mas não tenho concentração suficiente para ler. nem para escrever. estou alerta. assim como ela, dormia. mas dormia alerta. eu sou alguém de destino fragil, e que não recebe nada a mais por isso. tanto espaço aqui, nesse dia de nuvens bufantes e robustas. a cidade do caos. do trabalho de recompensa. um mercado de frutas novas e suculentas, contudo, ainda aqui sentada, estou pensando em ir embora, trancar por fora a porta. sumir do mapa. não medo, mas incerteza. outra vez trocaria tudo o que não tenho pela incerteza. tem um copo de água sobre a mesa, a me encarar. ele está aqui a mais tempo que eu, e parece não me deixar fazer meu trabalho. sequer consigo esperar quieta. não sei quanto tempo mais eles irão demorar. espero que voltem logo, ou não voltem mais.

de um corpo morto para um corpo mudo, em uma quinta-feira, depois de um tiro

meu amor, me perdôe pelos erros que cometi, ainda em vida. não tive intenção de lhe causar dor, nem mágoas. nunca quis lhe deixar com ressentimentos em relação a mim, ou a quem fomos. tenho certeza que fomos tudo o que poderíamos ter sido: eu gostava do pouco que tinhamos. gostava do nosso abajur de luz fraca da sala e da cortina de rendas. eu gostava do seu vestido de seda e dos seus sapatos de verniz. eu gostava do formato do seu nariz e das suas unhas. do seu quadril, dos seus broches, do seu toque, da sua pele na minha. sabe, minha nova casa não tem mais flores. não tenho mais janelas ou portas com placas que convidavam amigos queridos. sequer tenho amigos agora.

meu amor, me perdôe pelas vezes que me omiti, ainda em vida. desculpe por sair sem levar o guarda-chuva no dia que seu cabelo estava mais arrumado. não quis lhe deixar esperando horas, enquanto bebia e culpava o transito. talvez eu não tenha lhe gostado demais, mas lhe gostei com tudo que tinha. é, às vezes sou pequeno mesmo - você era minha pequinininha também. sou restrito às vezes, poético demais. não penso: gasto dinheiro à toa com revistas sobre a segunda guerra mundial. eu gostava as fotografias que tiravamos nas viagens, principalmente naquela que fizemos ao caribe, há dois anos. fazia tempo que eu não sentia o prazer de uma boa companhia. eu gostava dos talheres que usavamos para jantar aqui no quarto, aos domingos. adorava nossas segundas-ferias e quartas à tarde. nossos sábados abraçados.

meu amor, me perdoe pelas vezes que insisti, ainda em vida.
pelas vezes que menti.
que julguei.
que me precipitei.
que revoguei.
que cantei alto ou chorei baixo.
(diziam que os homens não deveriam chorar)
que senti ciúmes ou que simplesmente não senti nada.
que perdi conversas cruciais.
que deixei de lavar a louça, fazer o almoço ou arrumar as latarias.
me perdôe pelas vezes que não troquei as lâmpadas.
não tirei o lixo.
não apostei minhas fichas no nosso futuro.
me perdôe por ter me dedicado tanto a você.
me perdôe, ainda em vida, por ser covarde.
desculpe minha solidão forçada.
eu não aguentei seu silêncio.

sábado, 5 de julho de 2008

achei que estivesse morta

alguém bancou a estúpida. e agora está tentando bancar a espertinha. não adianta, esqueça: seus olhos não valem nada. jamais os irá trocar por comida ou alguma bebida amarga. ela já não tem nada a oferecer. nem o decote, nem a linguagem vulgar. nem o topete. o corpete. nem sexo, nem cerveja. seu corpo não vale nada. até um alfinete lhe subestima: perdôe sua falta de modos. os pais não tem culpa que acabou por tornar-se tão mal educada. ela veio de uma cidade pequena e lá as pessoas não tinham o costume de sentir umas as outras. aquilo tudo era só um valezinho por trás da montanha e sequer estava no mapa. era só uma estrada velha que continuava sem motivo ou postos de gasolina. tudo sumia porque tinha que ser. tudo tinha que sofrer algum tipo de ação externa. e tinha que mexer as pernas o tempo todo por baixo da mesa, inquieta. parecia sempre assustada. e qual a ocasião? nada. apenas havia conseguido um emprego como guia de excursões - uma merda, pensava, mas pelo menos pagavam um vale refeição generoso. penteou o cabelo e saiu do banheiro depressa; melhor que aquilo, não ficaria. jogou as blusas que estavam sobre a cama dentro do armario e o fechou. trancou: apenas as aparências importavam. não passou batom, nem sombra. era aquele monte de pele que sempre foi. era seu primeiro emprego de verdade, antes disso, somente horas como funcionária em um balcão de devoluções. estava farta do segundo lugar: ninguém nunca se lembra do segundo lugar. e certamente faria um desejo, de acreditasse nessa merda. haviam lhe dito que o homem era simpatico, e que ela o adoraria. em qualquer outro dia, esse pensamentos seria um record de desperdicio de tempo. então a mesma cara, de quem não se arruma para nada. queria simplesmente não ser, mas não dá. e como tudo que é muito grande, é impossivel manter todos os principios intactos: aparentemente estavam dando seu telefone em agencias do corrêio. tem recebido mensagens entranhas. recados cortados com linhas cruzadas e ruídos. não importava, não deveria estar a se destrair com tão pouco. não era linda. nem gostosa. a sedução era somente uma forma feminina de persuasão.

carinho

desculpe, eu não queria estragar seu sonho.
você não estragou.
não?
não.

ambulante | 4

vou contar-lhes, sem qualquer redenção de detalhes, sua trajetória. ela tinha os olhos levemente puxados: eu sempre lhe dizia isso. e ela dizia: olha no que você repara! verdade, ela tinha mesmo os olhos puxados. o cabelo escuro e bem definido, com curvas e ondas. ela tinha os lábios desenhados como feixes de luz, densos e poéticos. lábios de mistério. dentes perfeitos. e que defeitos, que nada. ela apenas falava demais. fantasiava demais. contava casos de seus casos passados e isso me deixava doente: tudo bem, estranho seria conviver com alguém que não possui assuntos pendentes. assim, lembro-me de lhe ter oferecido um gole de cerveja, há dias, como um convite. antes mesmo do primeiro beijo, a gentileza de oferecer bebidas. e porque, explica-me, tanta educação? os relacionamentos eram só uma desculpa para não se viver sozinho. que medo, tenho medo de morrer sozinha. de apodrecer sem ninguém. sequer consigo esperar quieta para ser atendida no destista. troco de revista com pressa. troco de revista várias vezes seguidas, entre chicletes e goles secos d'agua. não sei viver por mim, preciso sempre de companhia. de gente. sou gente que adora gente. movimento, agito, reboliço. ah, o trinco da porta ficou aberto depois que ela saiu. trancou por fora, e deixou a chave por trás do quadro azul, no corredor. ela me disse que achava estupidez deixar chaves escondidas na decoração do hall, mas o que pode fazer quanto a isso? nada, né: haveria de se render. então o fez. ajeitou a chave por detrás da obra e saiu. saí no corredor: seu cheiro ainda estava ali, planando entre a fumaça que subia da pastelaria. que porra, seria aquela hora de fritar pastéis? dessa forma, tenho preferência por elatados. condimentos. aromas artificias. não o cheiro natural de seu corpo, mas seu perfume. sua fantasia de ser reconhecida através de uma característica industrial. cosmética. estética. infame. outra vez, era só uma invenção. nenhum relato completo de sua existência, tampouco de sua permanência entre minhas pernas ou paredes. eu vivo em um cubículo. não posso mais continuar sem essa mentira.

sexta-feira, 4 de julho de 2008

ambulante | 3

pisquei breve. minha cabeça balançou como se fosse se soltar do resto do corpo - e eu ainda de pijama xadrez, blusa cinza e justa. meias largas com dedos faltantes. aquelas meias de algodão grosso e velho que soltam tufos de fios pelo caminho. então, um par dessas. cochilei por outro instante talvez, ainda mais breve que o anterior. morri, não sei. estava mole. nossos braços e pernas haviam se entrelaçado tanto que eu estava a duvidar se ainda tinha membros que me pertencessem propriamente. olhei para a cama: sua cintura permanecia intacta no colchão. que merda, ela nunca mais vai voltar. pensei em ter que beber o resto do vinho sozinha. fumar o final do maço sozinha. deitar sozinha e esperar. maldita espera que se prolonga outra vez. fechei a cortina e cuspi no vidro: merda de vida. tinha algo no corpo dela que me deixava presa, que me arrastava para perto dela, que me gostava com ela. fui até a cozinha e nada: as mesmas frigideiras e cadeiras. ainda nada, a não ser o sereno que umidecia a janela. pensei, então, eu telefonar para o número que ela havia deixado. talvez não fosse uma brincadeira, talvez não fosse apenas o número de uma casa de esfihas - definitivamente estou a imaginar situações que não fazem sentido. fizemos tudo que havia para fazer e, mesmo assim, será que não percebe? estou louca para vê-la. eu já sou louca por ela.

quinta-feira, 3 de julho de 2008

ambulante | 2

assoprei meus ombros, de forma a me livrar do cheiro. notei: estava a agir em vão. então reclinei a xícara para perto da boca: deixei o café escorrer por dentro de mim, ainda que frio e doce. estava tomada por ele, e, ele, estava a me vasculhar. a confusão de lencóis me dava a impressão de que ela estivesse voltando. aquilo era apenas uma fase, haveríamos de superar. deixou o telefone para que eu ligasse, caso viesse a me preocupar. estranho: sou sempre muito tranqüila em relação a breves ausências. esperaria pela ligação dela. postei-me, assim, próximo à janela e afastei a cortina bordada em azul e cinza. esfreguei o pulso contra o vidro, de modo a desembassá-lo um pouco: eis um círculo em meio a sujeira e gordura impregnada na paisagem. a rua estava com aquele mesmo tom cáqui de antes. as mesmas folhas secas e os mesmos carros. a mesma moça a pedir dinheiro. o mesmo sexo esquecido como se fosse um centavo velho - aliás, guardo meus centavos em uma redoma: ainda vou construir um castelo de pequenos restos.
acho que me distraí. cochilei por um segundo.

sério

_
e justamente quando você achar que tem tudo,
é bem capaz que tenha mesmo.

quarta-feira, 2 de julho de 2008

monólogo

entre declarações e beijo distantes, ela fazia longos silêncios ao telefone. longas pausas de pensamentos. talvez estivesse longe, talvez estivesse pendurada a uma linha muda. isso sempre lhe dava a impressão de estar a falar sozinha ou a conversar com ninguém.

terça-feira, 1 de julho de 2008

estou de volta ao básico

é tempo de esquecer agora. tempo de deixar para trás. de soltar, deixar ir. desapergar-se. nada mais do que existe aqui é para ser seduzido. talvez apenas ainda esteja presente para ser induzido ao erro, mas isso também já não tem tanta relevância. não adianta deduzir o final desta história: jamais acertará. o melhor que pode ser feito já está feito e, portanto, me impulsiona para frente. logo depois, me coloca a frente dos meus próprios planos e expectativas. sinto uma angústia. sinto certa carência insolúvel. vejo os olhos dela: primavera ela que se aproxima. o verão terminará em breve. o ano não pára, nem nos espera. uma anestesia no meu coração, por favor. um veneno letal no meu sofrimento. um jogo bobo de ganhar e perder - mas um jogo sério de poder. controle total sobre todos e sobre todas as situações. são todas ações simultâneas de amor e ódio perpétuo. simulo, agora, a falta dela. existe muito aqui que o tempo já não pode mais apagar: as lembranças me pertencem, ao menos. eu segurei sua mão esses anos todos. eu enxuguei suas lágrimas e espantei seus medos. eu amputei meu próprio desejo tantas vezes! juro, tentei ser o mais sincera possivel. tentei manter minha consciência funcionando em perfeito estado, mas não existia nenhum fundamento válido de verdade. será que só eu me dei conta disso? ou será que simplesmente levo tudo a serio demais? é besta demais essa situação. será que ela consegue entender a proporção dos fatos? será que compreende a dimensão do ato inconseqüente? será assim tão forte e necessária a experiência de viver em outro corpo, de conhecer outra vida, nem que por apenas um segundo? seria possível celebrar quantos aniversários em um minuto? quantas vezes seria preciso viver para morrer com dignidade? e o contrário, é valido? morreia quantas vezes seguidas para viver, pelo menos uma vez, plenamente?

eu poderia ficar acordada para ouvi-la respirar, eu sei que poderia. sei que suportaria o sono e o mal humor por ter dormido pouco. eu poderia, então, passar a vida inteira ao lado dela, escutando seu coração bater. imaginaria com o que ela estaria sonhando, mas, também, eu me perguntaria se até mesmo este sonho doce seria suficiente. às vezes é preciso fazer mais do que se espera que seja feito. então, só para sair da rotina, um copo de vinho. só para não deixar tudo ficar quieto, uma música velha ao fundo da sala, perto das cortinas. as cortinas repuxadas para o lado, atrás do sofá, para que se possa ver a avenida. e o barulho dos carros cheios de álcool. a necessidade do abraço. o braço tremendo de frio, encolhido embaixo do cobertor barato e fino. o retrato ainda pousado sobre o armário. o retrato dela, claro. sabe, eu a sinto com saudade.
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2007