domingo, 29 de março de 2009

dos homens loucos

ele falava coisas de como fazer bonecos de neve na grama. falava dos cachecóis que faria, e dos gorros também. dos olhos de botão, e do nariz de cenoura. seu pensamento representava um capítulo.

quinta-feira, 26 de março de 2009

O Ambiente

Foi uma surpresa retornar. Todo beijo nosso residia ali, como doença. Lembro-me da clara falta do ar, e do falso bombeamento de sangue dos pulsos. Fragilizei os joelhos. A minha respiração deixou de ser um suspiro e passou a ser um bafo longo e pontual. Uma martelada de ar que saía da minha boca, e por entre os dentes. Não passaria por isso de novo, eu pensava - eu já tinha jurado não passar. Já tinha esquecido - e eu já tinha jurado esquecer também. Mas a minha garganta tinha fechado e da janela vinha muito vento - e o balançar de cortinas, claro. Tive vontade de por a perna para fora, o rosto para fora e fazer buracos nele para ver se assim entrava ar em mim. Eu sentia as minhas pernas finas e as pontas dos dedos sensíveis, pontiagudas. Então eu apertei meu braço com a maior força que pude projetar: eu ainda era a maior decepção dele. Por que as bigornas não são brancas? Tinha um pesar nas minhas costas também. Há meses não chorava como hoje. Hoje, o dia mais cinza de todos. Errei na roupa, na frase, no cumprimento todo. Errei na piada, na ordem, na desordem das coisas. Eu precisava de um abraço hoje - daqueles sem fala, sem comentário. Sabe aquele aperto mudo do corpo do outro? Então, um desses. Não havia nada que pudesse fazer a minha direção mudar. A minha arte era essa e só. Não há a passibilidade da prioridade em mim. Eu já tinha enganado todo o mundo, e agora estava a voltar no tempo - e no prefácio dele. Eu já tive 50 anos. Eu já morri de câncer, de tuberculose, de tosse há 100 anos. Eu voltei com a mesma gripe de meses, e depois vim com uma falta de ar. Eu já morri de medo de guerra, e voltei inteira com 2 pernas. Porque a minha neurose vem da minha esperteza demasiada. Seria o cigarro desculpado pela genialidade? Achava que sim. Seria a minha vida outra vida? Seria minha a outra? Eu duvidava. Mulher nenhuma se atrasa tanto. E eu sei, eu tinha parado para resolver um problema. Mas acontece que o momento do erro me tomou o corpo e me tombou no álcool - eu perdi uma parte da história com isso. Eu já tive 50 anos, e agora estou voltando. Eu pausei o tempo, pousei sobre os ponteiros e os ajustei. Estalei os dedos e defini o momento do retorno. Dos tontos, um monte de trono de rei. Eu achava o escacho fácil, aquela separação toda. Mas a gente só percebe que falar é difícil quando perde essa capacidade. A minha lingua enrolou, e depois veio o reconhecimento tardio da perda. Os meus olhos ficaram dependendo de uma visão magra e turva - aquela madita hora mágica. Poderia cometer suicídio agora. Já morri. Já fui morta também - não há graça nisso. Eu parei no espelho, mas o contorno do olho já tinha feito um novo adorno em volta dele. Sabe alguém que levou um soco? Eu tinha levado 2. Eu tirei o rosto em volta do olho e o pus no chão. Eu sentei no meio do piso, e lancei aqueles 2 glóbulos de olhos para o alto - o aumento do espectro é decorrente do tamanho do erro que há nele. Eu parei na vaidade e na vulgaridade da cena. Imagina um grande rosto de choro e sem olhos? Imagina um rosto com dois furos, dois buracos negros dilacerados na frente, e a frente das coisas? A perda dos olhos, o malabarismo, o falso palhaço: era poético e até quase lúdico. A esse ponto a vitória realmente não era um desejo. O esquecimento era. O meu desejo era interromper o processo da criação. Parar com a idéia, com a fala, com o vibrar do branco do olho. Há de perceber o vibrar do branco do olho na irritação da fala? Eu tentava imaginar que sim. Acontece que o meu olho vibrava tanto que a minha concentração ficava comprometida. Eu sei, eu já tive 50 anos. Eu já fui a regressão do homem, e a paixão da mulher que regride exponencialmente. Eu fiz frente com os dentes na festa. Entende um ambiente que se chega, e que se agarra mordendo? Eu tinha mordido aquele andar inteiro. Eu tinha engolido suas lembranças dali, e regogitado seus desprazeres. Agora eu tinha problemas de salivação, de estômago, de memória fraca. Uma velha sem tempo e de 50 anos.

terça-feira, 24 de março de 2009

cortiços | 2

não existe a necessidade do grito. e se eu gostei? eu adorei.

eu era uma criança que tinha braços de gravetos, e pernas de cabides. e eu vi mais pessoas do que outras. na minha época, mamãe dizia, o inferno era aqui. as paredes eram feitas de caixas de uva. uma grande caixa de remendos. em cima, o som dos intervalos das músicas. não tinha silêncio por qualquer momento. as vezes demorava mais tempo para escutar do que para pensar. lá mamãe tinha um nome, aqui ela era mais uma. é o meio inevitável. tinham vários adornos - o quarto era um arquivo. daquele ano, esperaria o mínino de dignidade. sabe quando você fala, e ouve o que diz muito tempo depois? é que a mamãe era um estrondo. muito histérica, e com muita coisa no ego.

domingo, 22 de março de 2009

o navio

o que eu tentei colocar para ela era que não importava o que ela me dissesse, eu ainda me sentiria um anão. o meu corpo não aguentaria peso nenhum. tampouco, uma grosseria. eu ainda disse: a entrega não é só festa. mas ela já não tinha qualquer condição de flutuação. eu também não tinha, mas eu ainda me importava com as considerações finais que seriam feitas - talvez daí a diferença entre a gente e o grito dela também. porque ela soltou um assobio do grito, e fez um malabarismo com os braços logo depois. imagina, trariam seu corpo como um navio de carga, um grande latão de lixo flutuante! imagina, lembrariam dela assim, e de mim também.

quanto a família

seria a responsabilidade hereditária
uma forma de moldar a persepção?

sábado, 21 de março de 2009

o destaque da palavra - a ênfase

A gente escuta quase uma melodia. O começo e o término de uma frase é a primeira palavra. Mas eu fiz o contrario: uma frase aleatória no âmbito do dicionário. A cada início decido um novo início. O tom grave dá peso no texto; assim, é possível manipular o começo. Você pode estar sempre agudo - porque fica o canto, mas depois fica chato. Então você muda de lado.

(Ela era do tipo de mulher que as veias saltam nos pés.)

Na tortura eu elevaria o tom porque a atenção é fator notável da ênfase, e de todas as próximas fases de ostentação. Então eu acho adequada a proposta porque a pausa é uma sílaba - um belisco muito mais leve do que o deslocamento da fala propriamente. O deslocamento é o que a gente faz para colocar e destaque a palavra escolhida. Eu escolho a palavra de ênfase.
Há momentos de seta na sílaba. Silabar e prolongar - esse era meu objetivo. Mas como a cara da gente revela, se eu puder, eu falarei pouco na vida. Porque o que o respeito traz na gente, além da combinação dos sentidos multiplos? O prazer é oferta? O prazer é a oferta. O único jeito de ganhar no jogo é dizer que o outro acertou. A beleza não deveria ser enfatizada nesse sentido.
Às vezes eu acho que ela era mais bonita por fora. E penso que talvez roubar fosse tão prazeiroso quanto o sorriso violeta dela. Ela, com aqueles dentes brancos demais, tentava me tirar o olho do rosto. Pegaria meus olhos, como quem pega dois globos, duas órbitas insignificantes. Mas acontece que o olho dela dependia de um branco do meu. Um branco imenso e sigiloso. O branco que não desbota no infinito. A relação das cores comigo é simbólica.

quinta-feira, 19 de março de 2009

um dia na neve

o corpo que cai. o olho que geme. a gente sempre acabava preso a um eixo do tema. e também porque a inspiração costumava vir em duas épocas diferentes: ou nos tempos de fadiga ou nos de inércia. é que as coisas passam do suportável para o futuro muito fácil - e fazem de mim insuportável nas relações. vai ver são assim as grandes glórias da gente. nunca ninguém tinha feito nada nesse aspecto. foi então que eu percebi que eu tinha parado na relevãncia, ou na irrelevância disso tudo. eu imagino o ar que pode acabar - e eu enlouqueceria. eu imagino a estética de um lugar que não apaga a luz. uma insônia perpétua. um quarto branco. um dia nublado na neve - é, eu enlouqueceria.

quarta-feira, 18 de março de 2009

terça-feira, 17 de março de 2009

a importância parada

eu engoli as suas histórias. durante o sono, quando a gente se aquietava na cama, eu puxava sua cabeça para perto - o que não caiu até aqui, permanecerá fime. acontece. o que me passa é um mal estar. tinha algo que tentava engolir o nosso cenário - pensava ser a importância, talvez. como há na gente a politica de um relacionamento? esse abraço é sobre tudo, e por tudo que houve? talvez eu quisesse uma desculpa para estar fora, para jantar fora, para forrar a cama, e sair - um desdenho do que seria o ideal. mas não há insidência, nem crise. o que restou foi a metáfora da máquina. e do cérebro que perde a outra parte para o corpo. o cérebro aprende a outra parte e eu ponho meu braço em você. já foi a época em que eu só sabia fazer o que fazia.

sábado, 14 de março de 2009

sexta-feira, 13 de março de 2009

o décimo terceiro dia do mês em uma sexta.

Quem é superticioso, hoje deve estar desesperado. Eu sou uma das que nem saiu de casa - não acho isso um hipnotizar barato. Agora, para superar, só uns três casamentos. E o mais estranho é que você vê que o padre dá risada. Ele casa a gente e ri - é a autoridade flagelada! Há lugares que representam sínteses - para mim não. Vai faltar dia para mim. Vai faltar uma sexta-feira para mim porque alguns presupostos são filosóficos e qualquer coisa nesse sentido já seria um ganho. Eu tive que migrar para outro grupo e começar uma nova cadeira. O imperativo de uma perspectiva óptica é um vício de origem, um vício da ideologia. Uma das mais despreziveis profissões é não ser gente. Mas este também não é o único destino obrigatório. Um azar. E a sorte é que a partir de uma dinâmica, vem a compreensão com uma série de dados que confirmam isso. Porque o cientista precisa de uma insenção - tipo deturpar a pesquisa. O cientista sabe que a dominação pela força é precária: daí a supertição. "O pior escravo é o escravo satisfeito" - tem razão. Porque o destinatário primeiro sou eu. Quantas pessoas estão em situação de fome agora? Tem dinheiro para salvar o dinheiro dos ricos, mas não tem dinheiro para salvar a vida dos pobres. Eu me sinto totalmente tragado pelo sistema. Por isso a permanência em casa nessa brava sexta-feira treze. Brava. Bravo.

o ministério das coisas

a curiosidade é incrível.
EU NÃO.

quinta-feira, 12 de março de 2009

notas | 19 - outra parte

talvez a chance da amizade dar certo
fosse proporcioanl ao nível crescente de erotismo que ela carrega.

quarta-feira, 11 de março de 2009

notas | 19

talvez a amizade fosse medida pela quantidade
de erotismo que ela pudesse vir a suportar.

quanto a beleza das coisas

a gente tragou tudo, soltou, vomitou tudo porque o drama é pontual. eu ainda não estou satisfeita ou em situação de fastio - eu quero ainda poder descrever a loucura da mulher bêbada com maior quantidade de detalhes. e de beijos, claro. mas, no contexto, eu sou ela. e ela é meu corpo, inevitavelmente.


não há dança na lembrança que conduza o desfecho. não há abraço que o justifique também. não há desejo, demência, destreza, dormência nos pés ou nos lábios que comprove. porque a prova está na inconstância, na futura instância da dança que não houve. e que não haverá também. a função do corpo está na história agora - ou na boa memória, pelo menos. só há o instante do cubículo da mulher bêbada para ser lembrado. e há o instante de seus beijos, claro.

havia o espaço pequeníssimo de tempo para que se olhasse a mulher bêbada no espelho - e para que se visse nela, logo depois. porque sempre há na preocupação um segmento visceral - e de estrutura. a cabeça não alocava brincos, nem tino. pouco cabelo cortado, pouco vestido, pano, manga. uma beleza sem afluência - um reinar do avesso (e onde avesso é a ideal inquietação dos beijos, claro.)

a escolha é a condição do outro.

segunda-feira, 9 de março de 2009

a ruína

era uma casa linda. tinha umas árvores secas desenhadas nas paredes brancas, em preto. tinha um ar de não pertencer a nada, nem a ninguém. era de todos. meu, seu. de todos nós. seu cabelo era um monte de raiz enorme que saía de sua cabeça. porque eles poderiam atropelar a mulher que ela continuaria a pregar saias no varal. não há modernidade nisso, são apenas maneiras. será necessário decretar o óbvio. eu teria que morder as paredes para isso. porque a verdade é um voto, e assume o carater de quem quiser. porque as tardes recebem meu medo, e eu tenho medo de não saber o que eu sou no tempo. eu tenho medo de ter, ainda, medo próprio. eu morrerei de medo? eu morrerei de medo. eu não aguento mais esses arquivos de mim. essas listas. essas senhoras de verde, a rodar pelo salão. esse salão. essa teimosia. essas promesas. eu tenho medo de não saber fazer nada. de perder a função, de morrer de fome. de não caber. de não sobrar. de não ter quando tiver que dar. nem doar. de não suar. eu tenho medo de não ter silêncio. de não ter barulho ou ruído nenhum. eu tenho medo de não ter as cores com que eu sonhei nas paredes dessa casa.

o que eu tinha era um declínio.
uma derrocada.

domingo, 8 de março de 2009

uma mulher desse tipo

poderia abrir os braços no ar, dar a cara a tapas de outros e de terceiros. as amantes já não importavam mais. não importavam os almoços de família. a bebida, a droga, o disco. o rosto era um tabuleiro de dedos, e de arranhões. os peões, os dados, o jogo, o ganho: tudo perdido. tinha aberto uma fenda no tempo, e jogado o corpo. tinha tragado o cigarro, e jogado fora. tinha dado o corpo, e jogado o tempo. tinha terminado tudo, e começado tudo de novo. nenhum elogio, nenhuma reclamação tão boa. os amantes já não lhe interessavam mais. ela, a mulher que tombou para o lado.

o outro de mim

o espelho é o olho do avesso.

quinta-feira, 5 de março de 2009

o ponto

eu fiz na cabeça uma sentença.
mesmo no viés da dúvida,
o cume do lado para o qual eu tombei ainda era maior
- e mais alto.

quarta-feira, 4 de março de 2009

ah, sua belíssima!

poderia ser qualquer coisa.
um dia, dois. a semana inteira.
poderia ser o sangue, o suor, a saudade das coisas.

(o tempo passa para todo mundo, disse.)

poderia ser a grávida.
a trágica. a tela, o traste, a tentativa.
poderia ser o negócio.
o seu.
o dela.
o nosso.
IMAGINA O SUSTO?
poderia, a partir do conjunto, estabelecer uma tese.
mas a tinta do cabelo pingava nos ombros.
-malditas coisas que nunca ficavam prontas.
o vermelho não pegava.
se funcionasse, ficaria linda.
mas o vermelho não pegava.
BELÍSSIMA!
porque ela era a mulher mais linda e a mais estranha também.
o livro, o encargo, o ditado popular na ponta da língua.
na praça, o doce.
no doce, a douçura da gentileza.
na gentileza, a moral que movimenta.

vestiu um vestido emprestado:
sua imagem não valia nada.
o laço caiu, o olho, a ruga do olho.
pegou a cortina e saiu.

era uma mulher belissíma que fazia uma dança belíssima.
sairia ilesa.
mas seria a mesma logo depois.
ah, sua belíssima!
(sua imprestável!)

imagina uma mulher com pé de boi:
era ela.
no peso, o peso e só.

nada

A ATENÇÃO QUE FAZIA UM RISCO NO SILÊNCIO,
UM PRANTO,
UM PENAR E MAIS NADA.

tudo era isso.

terça-feira, 3 de março de 2009

pendências

não haveria presuposto a este ponto. com medo de que o sujeito deixasse a sala, aquele pavor de ver suas costas, ainda tentou pela derradeira última vez. um consolo:
- e se o senhor aceitasse mais uma xícara. talvez pudessemos conversar.
percebeu certa intriga. não havia mais nada para ser dito.
- o que há para conversar?
- não há.
- não há?
sentou-se. tinha alguma coisa a ser dita ainda. aceitou a xícara de café, completou com açúcar. bebeu em um gole só. agradeceu em seguida.
- agora você pode ir embora.

e então sim vieram as costas.

sobre exatas ciências exatas

alguém planeja matar mas não mata.
e porque os estudiosos não prevêm essas coisas?

domingo, 1 de março de 2009