quarta-feira, 9 de março de 2011

à ana | 11

ao carnaval de ana, em casa de ana.


em quantas festas quantas vezes você já se sentiu à vontade? há um estranhamento, claro. mas o que a principio não é estranho? então você começa a andar pelo salão: reconhece pessoas, desconhece casais, já não imagina o porque daquelas crianças. vê roupas, cabelos, vestidos horriveis, inadequação da moda. a beleza das festas tende a estar parada, e quando o seu olhar para: você a reconhece. em um canto, sentada quase ao seu lado, a beleza da festa, a unica beleza festiva possivel.

ah, ana! penso em tanta coisa. penso até em nossa geladeira cheia de suas garrafas de plástico cheias de água. queria ter-lhe escrito uma confissão, mas minha intuição só aconteceu agora que me deitei. estava esperando ainda que você saisse do banho. pois que hoje não vou acender a televisão, nem fazer musica, nem serenata: quase nada. hoje à noite, só o silêncio descendo aqui nesta casa-lugar. eu me casaria com você - não hoje, entenda - mas na vida. quem foi que te trouxe? pois que não me responda que foi a vida, porque eu já não acreditaria. eu dormi, mas naquela hora não. eu dormia porque era a sua parte anjo que falava, e era a minha parte anjo que escutava você falar também. eu me apaixonei outra vez. foi como se você buscasse na parte mulher o que sentia e de forma doce colocava as palavras organizadas em sua boca. anjo, que mexeu os lábios para falar de saudade na medida em que apressava o coração: naquela hora eu não tive pressa. porque mesmo que as vezes as nossas malas pareçam pequenas no mundo e grandes no quarto, eu voltaria para este sono infinitas vezes. porque minha cabeça tinha feito as pazes, depois fez as malas - naquela hora que tinha parado de fazer de conta.

minha recepção foi quase uma pergunta: o que você veio fazer aqui de volta, além de tumulto? respondi em pergunta para mim também: e como você tem estado sem eu estar aqui? você me vê indo embora eu já me vê longe? há quanto tempo, exatamente, você me vê de longe? eu construí um muro ou eu só tenho estado morando há quilometros de distância? você perguntou como eu estava hoje? eu também não quis saber.

ainda ouço, e ainda sinto as pequenas correntes de ar formadas pela sua respiração enquanto você dormia. estive presente. pus meus braços em todo lugar de nossa dança de sono. houve pernas de um lado a outro, você se lembra? e você me acompanhou em todos os passos - e mesmo eu, que bem pouco danço, me reinventei naquela coreografia meio sonho, meio saudade. pois que dormir abraçado, ana, não é deitar-se junto - mas é dormir e manter-se de braços dados, nos braços do outro não somente sobre o colchão, mas no compartilhar terno do sono. foi assim que você me encontrou? porque eu sei que minha alma emerge do corpo quando durmo e sai a te buscar na rua. foi assim que te encontrei? porque quando minha alma voltou ao corpo, depois do primeiro beijo, deitou-se calma sobre mim e disse: aconteceu algo. e essa frase, bem pequena e silenciosa, fez um eco dentro do universo inteiro - e você pensou, ainda que sem entender: aconteceu algo. é, aconteceu.

domingo, 6 de março de 2011

a história do homem mundo

o homem mundo existe agora -
mas claro que sua existência exige muita insistência também.


pois que minha parte poeta também subiu até o final de um rio imenso, colocou os pés na água e depois os colocou para correr sobre umas pedras disformes de uma montanha muito alta. eu quase ri. não precisava de clareza para enxergar - o que poderia ser um motivo para tão rápida subida, não precisava de silêncio também, para concluir qualquer coisa que pensasse: não. era aquela subida a vontade de tocar o começo do céu - de onde cairam os anjos que lhe são companhia. para ver qual o gosto que tem as nuvens brancas sobre sua cabeça (ou até aquelas quase cinzas ou pretas); e para saber, enfim, que pensamento lhe rege a mente - saber que tipo de gente é, que pessoa vai ser dali em diante.

houve muito medo também, pois que essa parte poeta desconhecia a forma exata do inicio do céu. poderia ser aquilo parte de um inverno rigoroso, de uma primavera esquisita. poderia ser parte de um calor que o fizesse ficar sufocado, ou de um dulçor, ou de uma acidez intragável. temia que fosse feito esperança, e que o largasse esperando. mas dessa vez sua curiosidade não trouxe mágoas - e ele trouxe na ponta dos dedos um pedaço daquele céu tocado. céu que não era doce, nem amargo. que não era feito gelo, nem feito verão. que não doía e que não fazia doer também. o que fez foi um sorriso nele - já que ali era ele mesmo. aquele céu que via e tocava era o céu de toda imaginação que tinha. conseguiu pensar apenas que aquilo era uma bela invenção. e depois pensou em quanta demora poderia ter havido antes disso? há quanto tempo estava ali, e fosse como fosse, não tinha esquecido.

estava curvado, imerso dentro de si na vista daquele infinito próprio, em sua cabeça, sob suas memorias e a dividir espaço com as lembranças e o que poderia haver de sonho dali em diante. adiante, pensou esta tal parte poeta, que talvez encontrasse outra parte de poesia como esta que era. andar não custaria nada ali. aquele lugar era lugar nenhum, e tudo. era o homem dentro do mundo dentro dele, e ele no homem do mundo dentro de tudo. todo mundo era um mundo ali.

quarta-feira, 2 de março de 2011

à ana | 10

quantas vezes as coisas lhe disseram coisas? quantas vezes seu amor foi incrivel? quantas vezeslhe caiu lágrima de um olho e prontidão sobre a vida do outro? sabe, é a primeira vez que vejo significado nas coisas ao redor e que não falam, é a primeira vez que discurso em siêncio, a primeira vez que sou imbativel, que estou pronta sobre a vida e sobre as lágrimas de antes. sabe, ana, é a primeira vez que existem cartas de mim ao leitor especifico. você, minha leitora, você, minha palavra que se forma sozinha, minha frase, meu palavreado que engracedeu - e que cuido com tanto gosto pelo proprio cuidado que quer para mim também. eu sinto você aqui em forma de falta, de desencontro esquisito, de presença imaterial. mesmo na forma de beijos dados em outro tempo, sinto você, como enlaço de mim, como força - numa exata propulsão que me leva sem me atirar. que não é repulsa, mas me repuxa o corpo todo, na mesma forma como faz repuxar o seu: nossa dança, tão facilmente reconhecivel.

então que venham logo essas alegorias de carnaval e de samba de época, pois que nossa dança está para além deste mês de festa.