querida maria paula.
este diario nao tem me bastado. preciso conversar com alguem. lembra que lhe disse, na outra vez, que ainda gostaria de me apaixonar novamente, antes de morrer? me perdoe minha amiga, eu estava mentindo. eu gostaria de jamais ter essa sensação novamente se pudesse. meu corpo não suportaria. a vista nao é mais bonita daqui. as viagens perderam-se em uma importância distante e nebulosa. a ausência. há fantasma de coisas repudiadas aqui. será possivel eu estar enlouquecendo? eu tenho tido a sensação de bichos andando pelo meu corpo, e as minhas pálpebras pesam tanto que minha cabeça permanece baixa. as unhas comidas, os dedos, as mãos que nao sossegam. eu nao vi os avisos? eu perdi o ar em um mundo que respira sexualidade e juventude. e agora? eu não pertenço. o meu corpo não cabe neste lugar. talvez você não devesse vir até aqui, acho que eu seria uma odiosa companhia. decidi voltar a fumar. decidi parar de procurar meus amigos, porque cada vez que conto a eles a dor desta inflamação reverbera dentro da minha cabeça. toda vez que conto a eles é como se eu fosse deixada novamente, eu me vejo sentada, sozinha, de volta ao ponto de inicio. quantas vezes você já desejou perder a memória? por que imaginamos as pessoas que amamos transando com outras, por que, me diga, esta é a primeira coisa que pensamos? não me diga que sobreviveu para além deste mal. é porque isso representa a perda, a falta de alcance? quando as pessoas se amam elas se tocam o tempo todo, nao é? diga, minha amiga, se estou inundada nesta carencia, na frieza que se tornou este lugar. luto para não embrutecer, embora meu corpo esteja se enrijecendo a cada segundo. de repente as pessoas sao seduzidas por mais paciência, por mais doçura. e esta acidez, que lubrifica verdadeiramente as relaçoes cai no esquecimento. na implicancia cotidiana, as coisas mais bonitas tendem a ser reduzidas. o afeto pede mais que amor. e o amor não esquece.
com urgência,
ana.
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