segunda-feira, 30 de janeiro de 2012

never travel without my diary

há tres coisas a se escrever na vida.
sobre a morte, sobre o tempo e sobre o amor.




SOBRE A MORTE ///////////


a sensação da morte tem sido derradeira sobre mim. meu rosto tem se tombando mais, meu pescoço feito uma mola que tenta segurar um balão de ar no alto. há o pretexto de deixar este corpo incapaz algumas vezes e estas perguntas para acalmá-lo junto a esta inevitável finitude. noutras vezes, os palmos da morte me assombram como um demonio sem rosto, que tenta me buscar e sussurra a inutilidade das minhas desconfianças, de todos os relacionamentos que tive, de tudo. 'nada mais existirá daqui a cem anos'. então, a ideia da morte reverbera e tudo se torna como ela. da inconstancia do calor à falta de envolvimento, seus dedos tocam tudo.

domingo, 22 de janeiro de 2012

izabella e suas metáforas sensivelmente reais

izabella e suas metáforas sensivelmente reais, foi assim que decidiu chamá-la. em metade de um susto, e tomada por uma pressa de viver, os pulmões pararam sob o risco do som agudo e fino de uma suposta arritimia cardíaca. houve um silencio sobre tudo até que a alteração da frequência dos batimentos fosse recuperando o curso, sem ser lento nem acelerado, simplesmente irregular, esse compasso foi voltando feito duas luzes que piscam alternadas e se encontram em determinando tempo, repetidamente. houve o pensamento de que o compasso desordenado de quem se apaixona põe danças inteiras sob pena de cairem no esquecimento. então desarmou-se. pensou que houvesse a ideia de flores belas demais no esquecimento, como dias intensos à deriva. pensa em azul. precisa recuperar o ar no impulso, ou ser jogada para fora, de um mar que já não traz nem leva nada. vai por as pantufas de quarto para trabalhar, os disfarces para viver. é tão incapaz das coisas difíceis! e nessa constatação, real e firme, sua voz começa a voltar, então aos poucos se descobre. desdobra-se como quem não sacode as roupas do armário há anos. mostra as palavras inflamadas, no espelho de vidro, nos olhos cujo calor aquece as pálpebras, que restaram como resta pouca saudade de quem ainda está vivo. 'ninguem se desfaz à toa'. sabe que são as inconveniências diárias que tornam indomáveis as chateações. mas os bichos só saem quando tem forma o suficiente para isso. então sente-se como um bicho de fora. bicho criado em casa que não soube ser cafajeste de rua. queria ser livre e original. mas a liberdade está presa a originalidade e não há originalidade nenhuma em querer ser livre. são apenas recorrências. e só há uma maneira de ter paz dentro de um furacão: se tornando um. izabella, que despertou metáforas sensivelmente reais nela.




põe um pouco os pés de lado, cruzados como se dessem um nó nas pontas. constantemente o escritor se propõe a uma dislexia imaginária. traz um cigarro a boca. há diversas noites que passa sob um desapego sem dó, mergulhada no universo da cama, sem nenhuma totalidade em relação ao sexo, a musica ou ao corpo. sente que está meio imersa em uma constante novamente, em busca de paixões nas quais pessoas demonstrem uma inteligência que verdadeiramente respeite. tinha sido interferência, e agora, quando solta essa fumaça tão densa, tão facilmente se dispersa junto. as interferêcias são as palavras ardias que não cabem na boca. 'as pessoas olham, elas observam você. isso não a incomoda?'. então leva as mãos até o ombro, fazendo quase "x" no peito, porque, no fundo, quer saber qual a textura do cabelo daquela pessoa, quer saber os olhos são tocaveis, se os ombros são largos ou se o corpo é estreito. desce correndo as escadas, tomada talvez pelo mesmo impasse de antes. 'eu caibo neste abraço?'. é assim que as coisas começam, com a facilidade da ideia de que as mãos tem de se encontrar sob pretexto de nada. os dias passam depressa, disfarçados de consolo e um pouco de fé. as dores unem mais as pessoas do que elas imaginam. é uma maneira irrisória de não estar sozinho, mesmo quando se foi deixado, quando não se está sob a pressa de ir. duas pessoas deixadas suportam, como ninguém, a outra num entendimento silencioso, de palavras sensivelmente reais, quase numa vergonha recíproca, numa nova fraternidade. izabella e as metáforas. foi assim que decidiu chamá-la.

terça-feira, 17 de janeiro de 2012

cartas marítimas | 3

fildesville, 13 de fevereiro de 2022.

querida maria paula.

este diario nao tem me bastado. preciso conversar com alguem. lembra que lhe disse, na outra vez, que ainda gostaria de me apaixonar novamente, antes de morrer? me perdoe minha amiga, eu estava mentindo. eu gostaria de jamais ter essa sensação novamente se pudesse. meu corpo não suportaria. a vista nao é mais bonita daqui. as viagens perderam-se em uma importância distante e nebulosa. a ausência. há fantasma de coisas repudiadas aqui. será possivel eu estar enlouquecendo? eu tenho tido a sensação de bichos andando pelo meu corpo, e as minhas pálpebras pesam tanto que minha cabeça permanece baixa. as unhas comidas, os dedos, as mãos que nao sossegam. eu nao vi os avisos? eu perdi o ar em um mundo que respira sexualidade e juventude. e agora? eu não pertenço. o meu corpo não cabe neste lugar. talvez você não devesse vir até aqui, acho que eu seria uma odiosa companhia. decidi voltar a fumar. decidi parar de procurar meus amigos, porque cada vez que conto a eles a dor desta inflamação reverbera dentro da minha cabeça. toda vez que conto a eles é como se eu fosse deixada novamente, eu me vejo sentada, sozinha, de volta ao ponto de inicio. quantas vezes você já desejou perder a memória? por que imaginamos as pessoas que amamos transando com outras, por que, me diga, esta é a primeira coisa que pensamos? não me diga que sobreviveu para além deste mal. é porque isso representa a perda, a falta de alcance? quando as pessoas se amam elas se tocam o tempo todo, nao é? diga, minha amiga, se estou inundada nesta carencia, na frieza que se tornou este lugar. luto para não embrutecer, embora meu corpo esteja se enrijecendo a cada segundo. de repente as pessoas sao seduzidas por mais paciência, por mais doçura. e esta acidez, que lubrifica verdadeiramente as relaçoes cai no esquecimento. na implicancia cotidiana, as coisas mais bonitas tendem a ser reduzidas. o afeto pede mais que amor. e o amor não esquece.

com urgência,
ana.

sexta-feira, 13 de janeiro de 2012

à ana | 17

eu deveria me perdoar por querer tanto você perto de mim? não pelo contrato, entenda. mas pela companhia. não há regras - as regras são feitas para acordos em que se ganha muito dinheiro. acontece que tua espontaniedade não pode ser trocada por nada, adquirida por nada. então que a tua paixão ainda me enlouqueça, mesmo que utimamente eu tenha puxado mais os cabelos imaginando qual tipo de solidão colocou os braços em volta de você. sabe, essa solidão tem me segurado também - ironicamente, meu riso sucede instantes de choro. fico horas imaginando sua vontade de ir embora, seu regresso e sua distância. há buracos incompreensiveis em todas as pessoas. eu senti como se eu tivesse sido arremessada, e no arremesso, a fragilidade - as coisas se quebram muito facilmente - de estar diante de um mundo que se abre, que se dilacera. e quando o mundo abre essa fenda, ou você respira ou você é sugmerdido: eu fiquei sem respirar por quatro horas. por quatro horas o inchado dos meus olhos me massacrou as idéias. ana, tenha cuidado por suas flores, mas não apenas por elas. tenha cuidado pelo nosso quintal, pela nossa vida, pelas plantas que colocamos lá. o amor não esquece. tenha carinho por nossos dias. meus braços não podem alcançá-la se você não esticá-los mininamente. você precisa curvar o corpo, tombar um pouco mais para cá. porque senão a minha busca é vazia. meu coração ainda bate aí? você ainda o guarda como seu? talvez tenhamos trocado sem perceber. talvez tenhamos pensado que a exuberancia que nos atraiu não valesse nada. filha da puta, eu. porque se muitas vezes brinquei com a incerteza do destino e da vida, hoje esse pensamento cai sobre mim sério e firme: não há nada certo. e essa dúvida latejante na minha cabeça, e me desconcerta, que me humila. eu fui muito inocente? eu fui muito longe? eu briguei pouco? entende como as coisas perderam a linha imaginária das respostas? então não me faça pensar que sou suficiente se não sou. não me faça pensar que sou eterna, que sou mãe de seus filhos, que sou namorada, esposa, mulher sua - se não sou. não me faça acreditar que seu humor é, por demais, encharcado de acidez, se ele não é. não me faça acreditar se você não está convencida. eu me apaixonei mais por você quando você não soube, quando você teve dúvidas, quando você teve receio, teve medo. porque as pessoas não crescem sozinhas. elas crescem com as pessoas que amam - e eu amo você.

terça-feira, 10 de janeiro de 2012

cartas marítimas | 2

fildsville, 03 de fevereiro de 2022.





querida maria paula,

é imensa minha alegria de ter recebido sua carta. talvez exista um cansaço real sobre as pessoas. alguma coisa que as tem feito ter necessidade de desacelerar, e as faz sentir meio acolhedoras, meio quase cafonas. sinto que é bom que a vida tenha tomado este rumo, de certa forma. assumo, que mesmo todo costume que desenvolvi perante esta cidade, o frio ainda me faz perder um pouco a mobilidade das juntas do corpo - engraçado é pensar que isso que me imobiliza também me faz querer estar mais perto de sabrina, quieta e serena. os damascos ainda são tantos, como já lhe disse, e ainda me espantam como são frescos e cheios de cor. você precisa vir, minha amiga, conhecer este vilarejo - garanto que ele lhe traria grande inspiração. há uma quietude acolhedora em tudo, mesmo que estejamos sempre a beira de um silêncio quase enlouquecedor - há de haver cuidado - é assim que nos mantemos sãs. fico feliz em saber que sua cirurgia aconteceu como planejado. sinto, contudo, nao estar ai para lhe fazer companhia. você ainda prefere suco com limões sicilianos? aqui eles existem aos montes tambem. tenho saudades do mar - mesmo que o tenha visto pouquissimas vezes. e acho ninguem pode ser verdadeiramente feliz sem ter visto o mar de perto. não tenho escrito grandes invenções mirabolante, nem fugas descabidas da realidade. contudo, gostaria de me apaixonar mais uma vez ainda se pudesse antes de morrer. mas talvez isso não seja possivel. quando me mandar seus manuscritos, eu devo ter algo para lhe enviar também - mesmo que sejam coisas mais antigas. quanto a pedro, não se aflite. espero que ele comece logo as férias - porque imagino que esteja ansioso para cuidar de você, mesmo com aquele jeito mais reservado dele. o cuidado faz bem às pessoas.

espero que suas pernas se recuperem logo entao, assim como espero uma visita de vocês. posso colocá-los no quarto dos fundos, o antigo atelier de sabrina que foi feito com uma madeira bem grossa e mantem o lugar sob uma calefação quase natural.

um grande beijo,
ana.

quinta-feira, 5 de janeiro de 2012

à beira de uma estrada vazia, ninguem pode convencer-se

o convencimento é um anão dançante a beira de uma estrada vazia. você nunca vai conseguir provar que ele existe, porque ele só existe no momento em que você fala dele. depois ele desaparece. então você tem de voltar a falar dele amanhã, e depois, e pra sempre. e ele vai se tornando a coisa mais chata do mundo - e as coisas chatas do mundo são todas meio irreais, mentirosas. tão farsantes como o próprio anão dançante a beira da estrada vazia, tal qual o convencimento - que está morto pela própria urgência que tem de existir. as coisas só existem quando as pessoas se interessam por elas.

quarta-feira, 4 de janeiro de 2012

Ana e as festas | 2

A JANELA POETICA
Ana e as festas.



[...] As festas são assim. Você não se apaixona pelas pessoas que estão nela, mas pela idéia irrisória da festa, pela idéia do evento que ela representa. Foi de tanto me apaixonar por essa idéia pequena que, quando conheci Sabrina, a euforia que me tomou nunca conseguiu me ensinar a calma de vê-la ou de conquistá-la. Ela fazia parte de uma celebração, de um contexto que eu não conseguia separa-la. O lugar dela era o que ela tinha para me mostar. Eu imaginei que a mulher que ela era tinha um passado interessante para mim desse jeito – acontece que isso é tão imprudente! Ela acabou por vestir-se desta condição de se mostrar para mim, eu vi, como se a importância das coisas estivesse fazer com que eu soubesse quem ela era – o que facilmente poderia nos fazer cair em uma amizade superficial. Tive cuidado. Tombei para o seu lado, meio envergonhada, meio curiosa. Era o meu primeiro ano em Fildsville e as tradições quase rurais daqui ainda me causavam um pouco de estranheza. Eu apreciava a idéia dos lareiras ligadas, das velas e das sombras que se criavam em razão disso. Aos poucos, era possível ver as casas para além delas mesmas, pequenos coloridos que surgiam aqui e ali enrubesciam a cidade basicamente branca e marrom. Existe uma agitação que toma pessoas que nao conhecem nada. James segurava a minha mão [...].

segunda-feira, 2 de janeiro de 2012

Ana e as festas

A JANELA POÉTICA
Ana e as festas.



A paixão do outro enraivece ao passo que a minha parece completamente íntegra. Eu não tive vontade de voltar para dançar com você, eu diria a ela. A dança é a forma mais imoral de aproximação. Na dança as mãos caem sob o juízo duvidoso do acaso, enquanto um se dilata e o outro se contrai, quase foge, eu tive vontade de voltar para ajudá-la. Ajudá-la a por o pratos em ordem, lavar as louças, jogar as latas, limpar a casa. O corpo tomba para o lado do outro, como pretexto de quase nada, ate que os dedos segurem cabelos e cintura. As mulheres tem inumeros lugares aos quais eu poderia me agarrar duante a dança Acontece que as festas rapidamente escapam do controle e, enquanto são o incomodo de uns, tornam-se o palco de outros. Eu tive vontade de cuidar, não de possuir; e deste zelo feito de posse, Sabrina parou a musica e apontou a porta. Seus olhos me consumiram toda. Eu nunca deveria ter chegado àquela porta com insistência – porque ali, quando eu saísse, no instante em que eu saísse, ela bateria aquela placa de madeira nas minhas costas, e subiria as escadas de volta correndo, desaparecendo da minha vista. Não coloquei o braço a frente para puxar seus cabelos, ainda que a minha vontade tivesse sido essa. Sabrina não dançou. Mas desfilou sua condição de mulher pelos cômodos da casa toda – não varreu o chão, mas sobre os tacos e rejuntes fez celebrações indígenas e reverenciou ao publico seu próprio cabaré [...].