domingo, 30 de novembro de 2008

das estradas

SORRY, BUT IT'S TIME TO GO.

é o chão que chacoalha.
fica uma grande espreita depois dessa.

parecia um domingo de gato, daqueles que a janela embassa quando se coloca os pregos nos olhos e tira do colo a camisa, a cabeça da noite que passou. os resquísios da noite que passou. talvez algum dia algum sistema mais praticável do que este faça parar de torcer as intenções. as minhas, ao menos, já estão todas dadas. e eu tinha medo de fazer um convite que mais fosse parecer uma imitação. todo mundo já tinha feito aquilo antes. todo mundo ja fez as demonstrações, as doações, as traduções que eu quis fazer. digo, por isso, que descascava as unhas em mim, que fazia amor como se colocasse em estado de pena a minha crueldade. do outro lado, eu percebo o que é devido passa rápido. o tempo é pouco quando se corre - e muito quando se espera. o que é metido passa rápido. e ela se espreme aqui comigo, como se quissesse ver comigo essa passagem da minha desatenção ou da minha preguiça. eu tenho a sensação de ter perdidos as botas no caminho. os cegos no caminho. os dias, as plantas, as tampas, a morte, a sogra, as solas no caminho. eu acho que deixei o caminho no caminho. quanto tempo demanda o tempo? e eu sinto ter deixado a nossa casa na loucura e a minha loucura - A MINHA LOUCURA - em casa. que casa? a nossa casa que ficou no meio da nossa rua? entao eu pensei, eu achei que eu teria que seguir com a minha vida e com a vida que era para ser nossa. nossa. eu lembro, ela trazia nela uma espera. ela pediu desculpa, mas disse que era tempo de ir, assim dessa forma mesmo. talvez o tempo fosse legido por ele próprio.eu vejo que alguma coisa me tira o que eu vejo. e o que eu vejo? eu vejo mais de um sol. dezenas deles, talvez centenas. o humor é uma arte corrosiva. impressionante, impressionante.

quarta-feira, 26 de novembro de 2008

segunda-feira, 24 de novembro de 2008

sexta-feira, 21 de novembro de 2008

os silêncios que gritam


Essas mariposas me têm incomodado. Percebe que o meu silêncio falará por mim? Você consegue entender a maneira como se processa um crime de paixão? Você deveria trocar a aparência pela essência. Note a origem patológica da paixão: a paixão que vira gripe, peneumonia, câncer, aids – não mata, mas faz morrer. Nem sempre a gente diz o que quer dizer. E quando acha que tem a dizer, falta coragem – e não que a coragem seja a ausência total do medo, ou que a gratidão seja esperar algo em troca. Mas quem precisa de um covarde ingrato? É bom não pensar, mas quem precisa de alguém que não pensa também? Essas mariposas me têm incomodado. Quantas mulheres você vê? Eu vejo todas – sejam caveiras, sejam ausências. Não se fala de um assassino como se fosse um coitado. Não se exalta um assassino chamando-o de louco. Quanto vale um silêncio? O prazer também pode ser um impulso que destroi; e você pode precisar ceder a sua decadência caso não consiga percebê-la antes. Perceber o limite é a primeira chance que se tem para superá-lo. A gente só perdôa quando percebe a miséria do outroquando coloca o coração na miséria do outro. E quanto a miséria da gente? A miséria da gente é a falha. Retomar o começo também é uma espécie de ponto final. É, essas mariposas me têm incomodado.


* the silence of the lambs

notas | 12

o proibido é INSTANTE.

terça-feira, 18 de novembro de 2008

multidões | 3

sentia uma fastio, uma falta de apetite, uma redundância. e outra vez aquela considerável porção de gente lhe cercava o corpo como uma cárcere de corpos nus e saudáveis. e tinha uma distância pequena, quase ínfima, entre o que a distinguia da algazarra, do ruído das vozes - finas dos homens e imponentes das mulheres. ah, as mulheres. tão mulheres que não se traçaria nada em suas faces a não ser rugas no rosto - assim, bem simples - ou do grande rosto que formavam todas elas. as linhas do tempo faziam caminhos na grande testa, convites na grande festa. nos sábados à tarde, mosteiros; retiros, silgilos. os sapatos eram detalhes - sabia que lhe tomariam tudo, de baixo para cima. a multidão, diferente do que poderia prever, lhe faria um favor. a plebe, a maioria das pessoas, não tinha pele no olho. não tinha pálpebra. imagina: a multidão era uma multidão que não dormia nunca. não recurvava nunca. não se embriagava. não fazia sexo. a multidão era gente - gente que não era gente.

e disse:

- essa é a porta que dá acesso ao sonho.
e disse o sonho. e disse a porta. e disse a droga. e disse o monstro.

segunda-feira, 17 de novembro de 2008

cinco de seis

(...) a terceira não falava, ela cuspia as sílabas, os acentos e as tremas que nem se usa mais. ela era pequena e vermelha. ela tropeçava parada nas palavras que dizia. a segunda usava um salto fino, uma agulha nos pés que fazia marteladas no piso frio. ela dava dimensão as palavras e falava de forma lúcida, reta, limpa. ela era azul. a primeira fazia grandes intervalos de palavras entre por e tirar os óculos. usava uma blusa de uma mulher de 30 anos, divorciada, 2 filhos. tinha uma cara de quem mexia com números - e ela era vermelha também. a próxima falava como se parecesse óbvio. usava um azul escuro que me puxava para baixo, para junto dela; um sobretudo preto de uma viúva jovem, loira e com bolsas cinzas debaixo dos olhos: olheiras do tempo que não se viveu ainda. depois disso, um corpo de pose, de ombros largos que se punham como um ponto de interrogação. ela era a mais misteriosa e parecia-me sempre não demonstrar tudo. falava sem envolvimento ou crença. não usava brincos, anéis ou colares. nenhuma maquiagem. era rica - e vermelha. a sexta, a última, não me interessou. não me intrigou em nada (...).

um passeio que era um grito.

era como fazer um passeio - eu tinha a sensação de gritos no silêncio. ele gritava comigo na minha cabeça como gritou tantas outras na minha presença. e ela gritava também, a acrescentar. um coro de gritos. um tapa no ar. um grito que tentava ser didático e que dava ódio. não sei ainda se gritava ou se pedia socorro. se chamava a atenção, ou se tentava tirá-la de mim. acho que não perdia nem ganhava, aquele grito só sabotava a gente. e virava, dividia a gente. tornava a gente bem menos gente. um grito que era um uivar. um grito que saía dos dentes, que fazia ranger os dentes. um grito que roía o tempo, que devorava a gente. um homem que era lobo, e uma mulher-hiena. um transtorno.

domingo, 16 de novembro de 2008

das posses

tinha uma lua cheia.
chamava-a linda lua.
e era uma lua amarela.
inflamada.
cheia de pus e de restrições.
e era dela. linda lua dela.

quarta-feira, 12 de novembro de 2008

o grilo

aquele grilo na minha orelha, como se fosse um toque, um transtorno. eu digo, estou quieta, me deixe! e ele ali, a martelar a minha idéia. o mesmo pêndulo, de um lado para o outro, insistente como sempre. ele não tem nenhuma novidade. fica como um guarda, um poste, um louco - e logo eu, que achava que todos os loucos babassem. um monstro. uma aberração. ah, minha consciência, estou quieta, me deixe! ou ao mesmo tire daqui essa insistência. eu queria dormir meu próprio sono - ou aboli-lo, que fosse; sanar meu incômodo. meu comportamento é do tipo que grita. eu queria tirar minha cabeça com a mão, mas não, ele ali, a colocá-la no lugar, a costurá-la no pescoço sobre os ombros, da forma mais acadêmica que poderia colocar. ah, me deixe em paz! e ele ainda a sofrer por mim porque sabe que vou deixá-lo. soltá-lo. castrá-lo. mandá-lo embora. soltar os cachorros atrás dele. sempre perturbá-lo. mandá-lo a merda. e mandar-lhe, simplesmente.

domingo, 9 de novembro de 2008

ah, se eu a conhecesse

foi como se ela tivese entrado e tomado tudo. ela estava planejando alguma coisa - eu sei, ela sempre ficava com aquele sorriso torto quando fazia planos. sua imagem me parecia ruidosa o tempo todo. então ele a pegou pelo braço, com aquela exelência de quem acaba de chegar para a festa, e a apresentou. ela me parecia uma saudação imensa, um cumprimento; e ainda um desalento, um talento faltante - coisa de artista mesmo. será que eu era um absurdo naquele hall social? ela me olhava como se tentasse entender: de quanta atenção você precisa? eu quis dizer-lhe que não precisava de nenhuma, tantas vezes, mas não me encoragei o suficiente para responder. ah, se eu a conhecesse. eu gostaria de ter trabalhado com a platéia, mas ela me fitava tanto que seu interesse exessivo me impedia de ter concentração. eu quis interromper-lhe, dizer que não precisava que ela me olhasse, tantas vezes, mas isso me dispersava ainda mais. eu já tinha exemplos bastante complicados em relação a isso - talvez dessa forma minha única reação foi dizer para que ficasse à vontade e ir embora. eu poderia jurar que havia lhe tregue os brincos que cairam. eu sei, não os guardei! - mas de algum jeito eles estavam lá. e estão aqui ainda, esperando. nós vamos esperá-la voltar, trazer tudo nosso de volta. ah, se eu a conhecesse. eu poderia tê-la levado para casa. ah, se eu ao menos a conhecesse.

sexta-feira, 7 de novembro de 2008

fazer das tripas, coração

não o desejo pelo mal, mas pelo feio. pela tentativa de ser feio e acabar por tornar-se feio - e ainda cheio de significado. então não pelo significado que pode gerar - e que provavelmente irá gerar - mas pelo excesso dele. pelas sobras, pela parte que transborda. pela parte que é grande demais para se suportar ou entender. você vai viver daquilo que extrapola e que sucede o infinito, o incondicional? você vai querer o todo ou tudo intacto? a tentativa é um mistério.

ontem ela chegou atrasada; hoje, adiantada. como é que eu vou saber então? precisa estabelecer uma ordem para que eu possa concluir de forma nobre o pensamento. ela é a primeira que tem traços grossos nas mãos, traços de terra. e no rosto, uma finesse, uma douçura estrangeira - vinda de cuba, talvez. ela não sabe, mas faz suposições sobre o lugar ideal de onde possa ter vindo - apesar de que o desconhecimento da origem pode fazer com que ela pertença a qualquer lugar. eu acho válido.

os dias estão a se tornar meses. as horas formam semanas inteiras de tempo: é, o tempo voa quando a gente se diverte. então não pela diversão em si, mas pela sensação de divertimento e de êxtase. daquele prazer ligeiro que deixa querer mais. a importância não vem de qualquer lugar. tudo bem, perdoem sua estupidez hoje - mas somente hoje, eu já lhe aconselhei quando a isso antes.

e quanto ao resto, ela está a arrancar meus cílios até. as meias de seda que não uso nunca. a nuca, a sede. as meias, a calça. os olhos de vidro, os sorrisos de plástico. o plastico do maço. o maço. o cigarro. a primeira tragada. o último respiro. a inspiração. a mão, o pé, o braço, o pescoço. as costas e as curvas das costas. as covas das costas. as curvas do corpo. o corpo, ainda que torto. o pouco espaço, a pouca luz, a pouca espera e paciência. necessita do corpo deitado com urgência: nenhum desconto vale tanto a pena.

eu já lhe aconselhei quanto a isso também.

terça-feira, 4 de novembro de 2008

os detalhes: as canecas de café

eu me lembro, ela havia pegado no sono próximo à janela. não a percebi, mas lembro de tê-la constatado assim sonolenta e pacífica. ela havia me dito que acordaria cedo, e que ela havia sido apenas uma criança nos anos 80 - não entendi em que lugar exatamente essa colocação se encaixava, mas também não a questionei. pensei que talvez não existisse nenhum lugar no mundo para crianças como eu irem ou ficarem - às vezes tenho a sensação de que tudo já está tomado; eu poderia ser revolucionária, e então alguém me diria: já fizeram isso antes, sinto muito.

ela se ajeitou daquela maneira como costumava se ajeitar sempre para tentar dormir. entrelaçava os braços no corpo, como se o contorcesse ou sentisse frio. aposto que ela me deixaria cobri-la com um lençol fino, mas ela dormia tão tranquila e quieta que tive receio de acordá-la. tanta pacificação era massiva e me atordoava. eu precisava fumá-la. torce-la. ou distorcer-me, que fosse. nada havia ficado no lugar: ela simplesmente dormiu e deixou as canecas cheias de café pela metade na pia. eu poderia arranhar as paredes do quarto. eu poderia entregar suas mentiras agora ou acordar sua familia inteira. eu podria publicar os segredos dela como se fossem meus. ela disse que a gente se pertencia de uma maneira estranha, particular. "eu não a conheço", disse. "eu não faço idéia de quem você seja". e ela me olhava planando sobre mim, como se o tempo se encaregasse de nos apresentar em outro momento. eu fiz um silêncio. e ela, como um anjo, encostou-se próximo à janela, à cortina, à pouca luz que tinha e dormiu. ela queria tomar minha única janela. minha única cortina. ela estava ali como se me vigiasse sem me encostar os olhos - e isso me incomodava.

notas | 10

para a internet:
e-mail pra quê?
existe algo MAIS fácil do que abrir um envelope?

domingo, 2 de novembro de 2008

nota posterior

foi legal não pensar. mas quem quer alguém que não pensa?

não precisar pensar

o processo corrria mais lento do que o comum. eu era uma convidada especial, ele havia me dito isso. e insistiu ainda, logo depois: chegue cedo, senão não terá lugar. cheguei. parei o carro perto e na sombra. levei uma bolsa pequena e muita paciência - mal passava pela porta. não sei quanto adoraria ser reduzida a um clichê cultural, mas ele continuava sem ligar. não devem estar chatiados, só devem estar com fome. a baixa umidade do ar causaria uma perda do equillibrio? não sei. ele disse para que eu escolhesse o meu sabor de sorvete favorito. eu disse para que ele escolhesse o dele. alguém disse que eu estava desviando do assunto. que fosse. eu me inscrevi nas aulas de culinária, no clube do livro, no curso de arquitetura. então eu experimentei o vestido. ele disse: feche um botão, parece que você está se oferecendo; e eu disse que eu realmente estava me oferecendo. não toque muito, não fale demais sobre os seus relacionamentos frustrados. eu entro ali em cima, e a gente se vê no meio. o quê? porque tantos patos em veneza? tantos? não sei, eu lhe disse. eu às vezes nem sei o que digo.

eu tomo decisões o dia todo.
mas nós ainda não tentamos o sofá perto da janela.
em termos de coisa séria, minha vida é uma bagunça.