segunda-feira, 8 de março de 2010

eterno presente | 5

talvez eu tivesse entregue uma canseira ao tempo. de toda a minha satisfação e disponibilidade, imaginava já estar farta de expressar força sobre ponteiros tão gastos. esse decorrer de horas era inativo, então eu ficava imaginando o que, possivelmente, poderia ter me trazido até aqui. muita coisa era absurda; se me perguntarem quem foi gabriela, eu diria que diferente de marcela que foi uma mulher enorme, gabriela foi uma mulher de verdade. meu conhecimento, meu pensamento nela representava um capítulo:

"cairia por terra a minha tentativa? hoje, acordar me desconcerta. faço dela uma imagem sem encaixe, quase vazia. eu não morri, talvez aí a origem do empobrecimento da minha queda. a morte era uma mulher que libertaria, como uma espécie que confiava na alma, na vontade do corpo que fazia da quietude um entendimento para a alma dela. eu queria cooperar no desenho da história, acontece que essa história foi a única história minha que tomou mais lugares do que tempo - e isso eu desconhecia, daí a minha tolice em relação ao corpo dela também. ela, na cama. eu a olhá-la muito e a pretexto de nada (como capitu, e marcela, e todas elas). ela teria que ter tido fundamento na discórdia. eu não exigi o controle, eu não perdi o corpo para outro. eu não entreguei a minha misericórdia, a minha tristeza, a minha pequena destreza. eu me coloquei na sua irracionalidade como se tivesse voltado a ter a idade dela quando essa insatisfação me ocorreu também, anos atrás. eu a entendo, entenda. e faço do meu entendimento uma continuidade da vida, e não uma ruptura. se eu tivesse enlouquecido, se tivesse perdido a cabeça, talvez a tivesse encontrado. acontece que, dessa vez, me bateu em meio a idéia uma dúvida conceitual, puramente acadêmica. eu me formava diante dela como se eu fosse uma defasagem de anos em relação a mim mesma. eu me via nela. nela, eu via o que eu tinha sido de mim um dia - a tratar do caos com frieza. porque a frieza, a crueldade da mulher é ainda maior diante de outra. eu via nela um exército que me abateria os brios, que me derrubaria o corpo no chão e o rosto por muito tempo. eu tentava montar uma postura que se mantivesse em pé, sobre os tolos pés que tinha, como ainda a contemplar seu tempo de dúvida. há coisas na vida pelas quais não se deve agradecer nunca? a dor tornaria a volta mais fácil, acontece que eu desprezava a volta agora. se o acaso havia feito tão bem às coisas, retroceder me parecia ousar em uma direção abstrata, contrária a nebulosa vontade dela. eu tentava andar, mas as minhas pernas ainda falseavam um pouco - talvez marcela estivesse a me ocorrer outra vez. ela tinha me inundado: como marcela, ela era uma onda gigante. se me perguntarem quem foi gabriela, eu direi que, assim como marcela, gabriela ela era onda gigante de óleo também."

ela tinha deixado nas linhas coisas ditas que eu também não entendia. talvez o meu exército a tivesse invadido também - porque os excessos que eu cometi não me fizeram desejá-la mais: eu já a gostava com tudo que tinha. eu tinha entendido isso como algo belíssimo também. o debate sempre gera necessidades.

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