quarta-feira, 29 de fevereiro de 2012

o que era para ser uma carta logo se tornou um sonoro 'some daqui agora'

pessoas indiscretas e refratárias : sobre isso, nenhuma novidade. mas parece que desceu sobre sua cabeça, ou sobre este monte de enfeite que você usa sobre e ao redor dela, uma falta de juizo, meio disfarçada de cartão de visita bem humorado. achei ridículo. não se deve falar de pessoas que não estão presentes - nem mesmo elogios. há pessoas que não conquistaram o direito de nos elogiar. é engraçado, mesmo agora que não prefiro nada que venha de você, eu gostava mais quando você se afundava naquela depressão inventada, tanta crise insoluvel, se mostrando a mulher voluntária, genio incoerente, bela e deliciosa. são imagens pesadas de se sustentar - e você não conseguiu. e logo o que era para se tornar uma admiravel confusão humana, tornou-se um amor desgostoso e mecânico. se vendeu até a alma, eu não sei, para registar sua beleza carente de hoje, mas, decerto, repartiu os orgãos por ai. os rins, e mesmo os pulmōes temem pelo pior. mas o corpo se adapta, não se preocupe. acontece que a cabeça, minha futura ex-esposa, torna as coisas insuportáveis. cuidado.

quarta-feira, 22 de fevereiro de 2012

cartas a alguem bem longe

venha deitar aqui. seus ombros. latejantes feito seus olhos. descreditados olhos. e eu, incredula de mim. misturada aos montes de coisas com as quais tive que lidar, e comunicar, e dizer que eu não tinha mais nada que me ligasse a você - o que, de certa forma, nunca deixou de ser verdade. o mundo tem uma organização tão imatura, você não acha? eu não precisaria lhe dizer que ainda existia um amor reservado em mim para você, conquistado, mas que agora tinha se tornado uma pedra num fundo de sala, um sorriso sem importância. eu sentei para esperar a vida, acontece que neste meio tempo se passaram seis meses. eu não vi? eu tinha uma imagem imutavel de você, mas suas lembranças já não eram mais nada. insustentáveis. são como soldados que me perseguiram, me intimidaram. e as paredes eram todos os lugares em que eu parava para descansar. escrevi a minha história? não só a minha. as coisas podem - e devem - ser inovadoras e revolucionarias, mas elas ainda devem fazer sentir a simplicidade. não vou mais me deitar aí, falar. seus ouvidos viverão sem mim, você, sem mim também. eu, ao contrário, vou viver dormindo menos. pois que meu samba deve sair de novo. um girassol buscando um desfile colorido. sem luzes perfeitas ou eternas. luzes ao meu alcance. meus braços humanos não precisam ser tão longos. as pessoas devem ser abraçadas próximo ao corpo. no corpo, os olhos tocam o céu. mesmo que ele não seja meu. nada é meu. mas tudo está próximo a mim agora.

quarta-feira, 15 de fevereiro de 2012

cartas de alguém bem perto | 4

à suas metaforas que estão ausentes hoje:

fiz um plano para esta noite e gostaria que você soubesse disso. achei inadequada minha camiseta do jack daniels para esta ocasião, para o bar ao qual vou hoje, mesmo sabendo que você a adora por 'motivos obvios' como você disse, e eu achei uma graça. ainda tenho a impressão que vou ve-la toda vez que a coloco - ela já carrega um pouco dos seus olhos sobre mim. imagino onde estarão seus olhos de sono hoje, de novo, ou seus cabelos que me diziam 'vou dormir, venha comigo'. hoje, pus uma cor diferente no meu cabelo, tentando ser outra pessoa na hora de sair. as pessoas me oferecerão cerveja e talvez copos cheios da boemia da cidade e das noites. aceitarei, da mesma forma que aceitarei meus cigarros sem relutância. aceitarei a noite de hoje mesmo intrigada imaginando o lugar em que deve estar o seu copo, seu corpo, suas pernas. o tempo passa diferente nesta cidade. tenho a impressão de você ter pegado um onibus que deixou este lugar em que estou, o que agora me faz ter vontade de querer pegar o carro e ir também. hoje, me sinto razoavelmente feliz com o caimento das minhas roupas, e devo continuar a usá-las ate domingo. gostaria de deixar uma memória das minhas saudades sobre elas, do meu cheiro de hoje. nada deste dia se guarda? talvez vontades desastrosas - quase sobre humanas - também consigam construir histórias. hoje, ainda sinto a mesma falta de ontem, de seus cometários invertebrados sobre o passado. cidades não são nada além de fronteiras. damn, i miss you.

sábado, 11 de fevereiro de 2012

out

você vai deitar de qual lado? eu só poderia ter-lhe perguntado isso. o corpo meio amolecido pela bebida, meio entregue ao cansaso, fez seus olhos se esticarem. seu consentimento estava por toda parte, mesmo que você não o tenha visto. não sei a que horas você ou eu chegamos. nem com quais pernas, nem com quais braços. mas agora eu permaneco deitada também para deixar que o mundo colecione meus interesses. quanto as minhas experiências, você nunca as experimentou, eu sei. então eu poderia sim tratá-la como esta noite bêbada e piscante. desvairada. eu poderia tê-la jogado aos pequenos bichos que veneram o corpo de meninas como você. e por você, eu digo, meio cinematográfica meio contemporânea. foi sua contestação que a trouxe até aqui? a sujeira urbana, a megalomania das histórias, a droga, os vicios juvenis e abismais? é entre a prosa e os verdadeiros fatos que existem os segredos. então eu teria que vê-la fazendo coisas mundanas, sem reverência. eu não poderia vê-la sorrir. não, eu não poderia. foi por esses cigarros que você veio? quais guerras você deixou para trás? você não diria. sua voz é estrangeira demais para mim - e a minha também seja para você talvez. vão tratá-la mal, pisá-la, mandá-la a merda. é isso que a ânsia faz com as pessoas, não é? 'tenha calma', mas isso é para mim. eu fico deitada na cama ao seu lado. imagino sua voz meio rouca, porque isso é tudo que posso. você, odiosa dos meios termos, levou meia duzia de abraços meus. nós fumamos uns cigarros e bolamos planos.

quinta-feira, 9 de fevereiro de 2012

seis primeiros meses

coloquei as malas no canto, proximo a entrada. e com 'malas', eu quero dizer as sacolas de feira que consegui juntar em casa, para juntar as minhas coisas e vir para cá. fevereiro nunca foi tão quente. vieram misturadas roupas, coisas de banho, chaves, umas fivelas novas e sem uso. talvez não exista nada de verdadeiramente essencial a quem foge. descobri que tenho mais pares de sapato do que pensava, que meu ventilador ocupava muito mais espaço do que na sala, e que mesmo colocadas quase em um saco de lixo, as minhas roupas levavam com elas certa poesia. tive que trazer toda poesia que fiz até hoje comigo, como uma espécie de segurança imaginária destas minhas férias. sei, não seriam férias.