terça-feira, 26 de maio de 2009

Marcela | 3

Eu já tinha vivenciado um romance antes. Eu já tinha experimentado gostar e dar de volta o gosto da companhia. Acontece que eu fiz da minha vontade a própria consignação dela. Eu explico: eu tinha um homem que muito fez por mim, que largou, que tombou a vida para que pudéssemos construir outra que fosse comum a nós dois. Ele era um homem cuja velhice não chegaria ou alcançaria nunca. E eu era uma mulher de vida por começar. Eu achava que viver era uma bravura. Como eu nunca tinha feito nada, com o passar do tempo, a nossa convivência já era imediata. Eu pedia cerca de dois cafés por vez, e demandava açúcar ao atendente também. Assim como o tempo demandava rotina, e a rotina demandava tempo. Eu conheci este homem em um café perto do café que eu freqüentava. É que as coisas quebram, e a gente é obrigado a mudar – eu mudei. Eu saí de onde eu estava. Eu deixei as minhas birras, peguei meu vício e mudei.
Na época, eu achei que isso seria difícil para mim, acontece que mesmo assim eu mudei. O café que eu passei a freqüentar por muitas vezes me remetia ao antigo quando eu entrava no começo – depois de alguns meses, eu já quase não tinha lembranças dele. Engraçado como a gente se aproveita tão pouco – ou por tão pouco tempo a ponto de esquecer. Eu não entendia se o esquecimento era uma geração tardia da memória, ou somente um lapso dela. O homem com o qual eu convivi naquele café foi embora ali mesmo. Eu explico: quando ele foi embora, eu contive a minha cabeça, e eu deixei que meu olho acompanhasse cada passo dele. Eu achei que se o perseguisse, estaria a salvo. O bule esvaziou, e a gente terminou logo depois. Eu fiquei parada por um bom tempo em tempos ruim. Porque todo rompimento é doloroso. Eu tinha pontadas horríveis no rim e nas costas. Para uma mulher nova, isso era um absurdo também. Eu intensifiquei meu vício, a minha insônia, a minha revolta das coisas. Porque eu achava que a vida tinha me passado por cima, me pisado nas costas mesmo. A vida tinha feito com que eu mudasse o meu café, a minha rotina, e a minha demanda específica das coisas por nada.

Um comentário:

  1. Nãaaao! Sempre demande açúcar, não importa o quanto amargarem seu café. É bom ser responsável pelo gosto das coisas, pelo menos de vez em quando...

    [amor ao seu blog]


    beijoguria.

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