segunda-feira, 17 de agosto de 2009

coleções

há tempos tenho dedicado pequenas espécies de dinheiro e de minutos a fazer coleções. coleções de calças, de meias, de textos sem precedência. coleções de diversas partidas e de algumas idas sem volta. coleções de chances aproveitadas e de outras nem tanto. coleções de livros que nunca voltarei a ler, de leituras que não voltarei a fazer e de tantos outros afazeres que, de tanto ocupar-me a vida, me impulsionaram a colecionar outras formas de existir também. coleções de pessoas que fui, de cortes de cabelos que tive, de dias sem sorte, de dias de quase atropelamentos. coleções de dias que quase morri também, e de outros que percebi que o pouco que tinha vivido talvez não chegasse a ser tão pouco assim. coleções de ônibus perdidos, de pressas, de preguiças histéricas. coleções de carências sem fundamentos, de maus modos, de xingamentos diversos que eu sequer acreditava existir. coleções de instrumentos que comprei e nunca aprendi a tocar. coleções de amigos e de ex-amigos, de amores e de grandes ex-amores. coleções de e-mails lidos, de cartas lidas, coleções de lembranças de tempos em que se ainda usava cartas - e era possível ter toda aquela agústia da espera de um resposta. coleções de respostas mal-criadas e de outras tantas pessoas mal-criadas que tive que pôr a parte da vida. coleções de selos que joguei fora, de caixas de rémédios, de receitas que joguei fora. coleções de cheiros e de sensações de extremo valor que já não valem nada. porque eu fiz coleções de fotos, de albuns, de adesivos. coleção de toda a nostalgia e de todo o saudosismo que eu acreditava não ter. coleções de pessoas mundanas demais, e de espíritos que há muito já se foram. coleções de cd's e de filmes. coleções de pequenos príncipes. coleções de grandes dores, de perdas, de ganhos, de trapaças em tempos que ainda era possível saber o que as pessoas em que se confia pensavam. coleções de notas de rodapé, de capetes gastos, de tapetes velhos, de topetes estranhos, de barunhos estranhos, de intermináveis momentos de choro. coleções de momentos de silêncio em tempos em que as pessoas não tinham que pagar para conversar. coleções de gentilezas e de grosserias caóticas. coleções de caóticos emgarrafamentos. coleções de garrafas vazias, de fins, de meios, de recomeços.

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