Aconteceu tudo, naquele segundo antes do beijo. Às vezes, acho que demorou o tempo de uma piscada, noutras de estrada que parece não levar a lugar nenhum aparente, só asfalto. O segundo antes do beijo: o reticente mais interessante, o incerto mais sedutor, todo afeto aprisionado no ar, no tempo da fração de um segundo miúdo. Acredito que o chão tenha diminuído, e progressivamente, a distancia entre o suspiro que passa comprimido no espaço entre as duas bocas e ato do encontro. Acho que não sobrou nada, nenhuma testemunha ocular deste acontecimento único, deste nervosismo óbvio do primeiro beijo que imagina, com delírio, a textura do outro lábio, ou a quentura das bochechas que se aproximam a galope. Neste instante, só existe o silencio do cuidado, de quem busca chegar na hora exata, na melhor hora, na hora inevitável, do contato que não pode mais ficar preso dentro de um corpo só. Imagino a tristeza das pessoas que morreram sem nunca terem vivido este momento. Que vida melancólica seria esta de nunca ter sucumbido a elegante dúvida do instante prévio ao beijo chega. Penso que tenho sorte; mas antes disso, penso que tenho você. E isso basta.
estou a iniciar um texto. eu me concentro: e eu sei, eu vou perder um tempo. é como se fosse ter um filho ou fosse decolar, pular de um prédio. passo a ser uma extensão de mim. tropeço, como um bêbado. trago a embriaguez comigo. sou apenas um pacote de receios. sou eu, resguardo.
segunda-feira, 8 de junho de 2015
Aquele segundo antes do beijo
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