terça-feira, 3 de novembro de 2009

Velha Eterna | 5

(...) Depois de um princípio quase místico, achou que não fosse preciso desmentir tudo depois. Se imagina, supondo o que poderia estar ali, diante dela nada mais seria necessário. Pensou não dormir durante esta noite inteira. Pois que agora, diante dela, a carta de uma prostituta.


Brincar não vai tornar nada real. Eu já sabia que o afeto vinha aos montes e todo pedaço não tocado do meu corpo tinha calhado no mesmo lugar. O prêmio sempre tem intenção - o dinheiro, o galanteio do homem: sempre tem intenção. Eu sou praticante de uma vida sobre-feliz. Eu sou o lado clandestino da história. E se a prostituta não tem um lado legítimo para defender, eu não tenho mesmo. Eu preferia ter uma emoção legítima para defender um vilão. Alguém em uma língua estrangeira diz o que eu já deveria estar fazendo: olha o teatro que ele está fazendo! A admissão do adultério: tratar a dor que agora sente porque a vida de todo mundo é meio parecido. A gente quer ser diferente, mas a gente quer muito mais ser igual. A prostituta saía na rua usando um vestido que praticamente a despia. Se não tinha pudor? Certamente não tinha. A loucura tem de ser uma louca: uma loucura viável. Há pessoas que se aproximam com certa cerimônia - mas é claro que há tietagem. A primeira vista, eu fui séria há muito tempo. Uma mulher de alma mais velha do que a aparência? Impossível, eu tinha crescido como um arrombador de portas em potencial. É a prostituta, essa surpresa. Algumas coisas eram muito lindas. De decisões solitárias e perigosas: em dez anos a prostituta errou. Tratou de homens que eram frágeis em um dia, mais frágeis ainda em outro. A prostituta também era humana. Erros pequenos foram graves, mas a timidez precisaria de mais tempo para ser entendida. Era uma profissão em que se era acusada de várias coisas - então vinham as respostas às perguntas incômodas. As criticas justas vieram depois. Eu via uma arrogância muito perigosa: conforme o tempo passava, a prostituta diminuía a letra. A superficialidade era da natureza dela porque não havia nada mais superficial no mundo. Pulverizava pequenas notas sem deixar nem escândalo, nem fama, nem remorso. É lógico que o advento é um evento que a prostitua usa. Cinquenta milhões de ossos já passaram por ela. A observação da vida dos outros era a vida da prostituta. E se ela morreria de inveja? Não, não morreria. Aquilo era divertido porque não era sério.


Era divertido porque não era sério? A nudez era breve. Lambeu o dedo, virou a página, passou ao próximo. (...)

2 comentários:

  1. Finalmente um texto interessante nessa minha pesquisa de blogs de hoje.
    Gostei da perte em que "não havia nada de mais superficial no mundo"
    As vezes ser superficial é praticamente mandatório, dependo do tipo de vida que se tem!

    Heidi Costa
    http://contosoudelirios.blogspot.com/

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