quinta-feira, 13 de agosto de 2015

Seus ombros suportam o mundo (*)

mana bernardes | instagram.com/manabernardes

MARIA

O cenário é simples: uma sala de espera. Sentada, uma senhora alemã segura a câmera fotográfica de última geração. Resmunga palavras sem vogais com o companheiro. À esquerda, em pé, um casal de turistas, provavelmente brasileiros em lua-de-mel. Atrás da pilastra, um mochileiro barbudo e sozinho. No centro do salão, os estudantes uruguaios em excursão. Uma família italiana, uma adolescente entediada, um menino com Síndrome de Down. Ainda faltam quinze minutos para o início da visita guiada.  Ela, uma mãe solteira, também aguarda. O local: Teatro Solís, Montevideo.

Existe uma semelhança entre todas as pessoas que estão em estado de espera. Um andar inquieto, um contínuo gesto de arrumar o cabelo intacto, conferir as horas. Viver é planejar o futuro. Então, ali permanecem procurando, discretamente, o melhor espaço para se posicionar perto da porta, conseguir o melhor lugar para acompanhar o guia, sem mostrar, categoricamente, estar levando vantagem sobre alguém. Os homens aguardam atentos pelas instruções, como soldados. As mulheres, em deslumbre fictício ou real, não importa, em sua maioria arrumadas, como pavões, exibem-se sobre altos e finos saltos feito agulhas riscando o chão de mármore. Todos, sem exceção, seguram o folheto explicativo sobre o Teatro.

Maria, a mãe solteira a quem me refiro, tem as mãos apoiadas sobre o ombro da filha. Jeito de mulher-mãe. A menina, parada, mas agitada pela incerteza do que está por vir, denota apreensão quanto ao passeio. Há três dias, deixaram a Espanha fugidas de um marido e pai alcoólatra. Cada momento é um destino

*Referencia ao poema "Os ombros suportam o mundo" de Carlos Drummond de Andrade.