segunda-feira, 30 de junho de 2008

que planos, que nada.

se continuar, sabe que a encontrará na esquina próxima. talvez tenha um ar rebelde ou rigoroso. não sabe, não pode criar suposições a seu respeito ainda. senta-se e aguarda. bate as mãos nas coxas, de modo a intensificar a espera: ela poderia ser qualquer uma. e ela bem que poderia também ter sido mais uma - existiam tantas mesmo. mas não. está a distribuir sorrisos depois do beijo que deram, como se tivesse dormido com um cabide na boca. é, era diferente. ela tinha os olhos compridos. sorria muito. falava muito. contavam histórias e misturavam os dedos. apesar de tudo, tinha medo. às vezes esquecia quem ela realmente era. comentavam sobre o dia: sabe, às vezes as palavras são desncessárias. ela veio até aqui, e a outra até lá: engraçado, ainda não tiveram tempo de tomar aquela cerveja. vai buscá-la onde for, não se importa. uma vez e outra estava a se apaixonar entre momentos de alegria e recompensas breves que não provinientes de ações que se efetivavam com o tempo: o tempo era apenas um invenção. uma fantasia. prometeu-lhe o cd, e não deu. um filme, não deu. precisava vê-la outra vez, pois. e com urgência. ela parecia entender também a urgência em abraçá-la, apesar da dúvida que sempre lhe ocorre nos momentos de decisão: só não se disponibilize por completo, pensava, caso contrário, faria papel de tola. então estava a manter todo o tipo de mistério em relação a suas atitudes. definitivamente se esquece o tempo todo quem ela é. entrega-lhe a boca, mais não o beijo. a língua, mas não os dentes. o sexo, mas não o corpo, nunca o corpo - este que lhe mantém estúpida sobre os pés. ah, relembra: adorava o jeito como ela sorria, franzindo o canto dos olhos. e então colocava as mãos no rosto, fingindo uma vergonha, uma douçura. não sabe, contudo, qualquer loucura precipitada não lhe causa segurança. qualquer coisa que decidir, inevitavelmente lhe irá gerar ressonância. era bom não estar assim tão sozinha, entretanto, repensa: em que estado mais fragil foi se meter? ela estava praticamente metida entre suas pernas, como se gerasse uma inquietação fora do comum. é, tem fumado demais. quer dormir com ela. e ela, que lhe disse de volta, em tom de curiosidade: quero dormir com você também. quero passar a noite com você. quero cometer exageros com você. uma vez e outra se deve mesmo cometer excessos, então, fuma demais. espera matar-se de qualquer doença que sequer apresenta sintomas. apenas tem medo de não caber dentro de si, e acabar espalhada por ai, sem ela.

ambulante

assim, terminei de passar o café naquela meia velha e o despejei por completo na xícara. o céu parecia uma malha cinza. adicionei meia dúzia de cubos de açúcar e mexi. remexi. estava inquieta por algum circustância futura que se estabeleceria em breve. não possuo exatamente lapsos de adivinhação em relação a instante futuro, mas dessa vez, em particular, o sábado se mostrava estranho. era um dia digno de desconfiança. não me trouxeram o jornal, nem o leite. talvez tivesse dormido mais que o usual. contorci o corpo e me senti estralar por inteiro. nenhum presente na porta, nenhuma cesta de frutas, nenhuma fruta mordida e depois deixada em cima da pia. nem ela, nem nada. apenas seu número de telefone esquecido como um lenço sobre o criado mudo. o telefone mudo. é, definiticamente não mudo mais. precisava começar uma nova história, mas acredite: aquela história era tudo que eu tinha. aquela história velha era a unica história que tinha. então nada que se repetisse mais que duas vezes seguidas mudaria a espera pela decisão dela. aquela era uma manhã estranha: há anos não me lembrava de ter acordado em uma manhã de inverno. e de janelas embassadas, cansadas, exaustas como eu. na cama, um reboliço: o formato deixado por seu corpo ainda se confundia com os travesseiros. seus brincos, seu saca-rolhas e seu isqueiro ainda estavam ali, intactos. o cinzeiro com lembranças e a cabeça com os restos de cigarro. tudo que era meu fedia a cigarro. eu era um vício ambulante.